31 janeiro 2006

Um passo adiante mas...


Julgo que os leitores locais deste "blog" também receberam na caixa do correio o papel cujo cabeçalho reproduzo ao lado.
Ele representa um significativo avanço na política de comunicação do executivo municipal de Alcochete porque, tal como escrevi em artigos precedentes – nomeadamente neste – o apoio popular alicerça o poder do governante mas só se conquista e se se mantém contacto permanente com os cidadãos.
Os números mencionados no papel são elucidativos mas não me surpreendem. Além disso, nem tudo o que por aí circula consta dele. Talvez a anunciada auditoria venha a cavar mais fundo.
Por agora relevo quatro questões de ética política:

1. O absurdo de um autarca se ter arvorado em Pai Natal, quando parte da obra foi financiada por empresas privadas e podem não ter sido honrados alguns compromissos contratuais. Tem o dever de se explicar e direito legal a fazê-lo através dos meios do município. A câmara está a preparar uma edição do Boletim Municipal. É boa oportunidade para fornecer os devidos esclarecimentos.

2. Uma espécie de pacto de silêncio dos eleitos no mandato anterior. Na câmara havia 3 vereadores da oposição e na assembleia municipal 11 deputados da oposição. Ao longo de 4 anos, a assembleia municipal – que tem, entre outras, a missão estatutária de acompanhar e fiscalizar a actividade do município – reuniu-se umas 20 vezes. Em todas as sessões é imperativa a apresentação de um relatório do presidente da câmara sobre a actividade do município e a sua situação financeira. Uma vez por ano é submetido, discutido e aprovado o relatório e contas do exercício anterior. Conheciam ou não os factos constantes do papel?

3. Os membros do actual executivo autárquico submeteram ao sufrágio dos eleitores um ambicioso programa eleitoral. Com ele ganharam as eleições, estão no poder e detêm a maioria. Mas há óbvias divergências entre o conteúdo do programa e o teor deste papel. Não têm mais nada a esclarecer?

4. Os eleitos são os representantes do povo nas instituições democráticas. O povo detém o poder surpremo e o direito de exigir aos eleitos a assumpção da responsabilidade neles delegada.

30 janeiro 2006

Corrida de Toiros e Ordem

Salvaguardados os planos distintos, tal como a celebração da missa, a corrida de toiros é a representação de uma ordem.
Ninguém vai a uma corrida de toiros esperando uma mudança da estrutura do espectáculo, mas já espera a máxima criatividade dentro das regras recebidas desde a bruma dos tempos.
Se personificássemos a corrida de toiros, ela talvez nos advertisse de que quanto mais regra, mais liberdade.
De facto não há liberdade que se espraie fora dos parâmetros da ordem.
A corrida de toiros é ordem do quê? De valores imemoriais como a coragem, a superação do medo, a arte (técnica), a acção da inteligência humana sobre as forças da natureza, o progresso com dignidade, etc. Estes valores estão fortemente ligados à afirmação do indivíduo. Nos direitos inalienáveis deste se estende o veio da civilização ocidental e cristã desde há dois mil anos.
Ora é esta civilização, considerada a velha ordem, que todas as esquerdas no mundo querem eliminar, substituindo-a por uma nova ordem que apagará o indivíduo a favor do colectivo à escala planetária. Aqui não há lugar para a Ideia de Deus nem para qualquer manifestação da cultura cujas raízes antropológicas ascendam àquele Princípio de Ordem Superior.
As esquerdas apenas contemporizam com as heranças culturais dos povos, o que se insere numa estratégia política mais vasta para a tomada do poder em toda a parte. Eis por que eu digo: amar a Festa Brava e apoiar partidos políticos de esquerda é uma contradição.

29 janeiro 2006

Neve em Alcochete!





Na sequência de uma descida brusca de temperatura (que, em cerca de uma hora, passou de 6 para 2 graus Celsius positivos), às 15h10 começou a nevar em Alcochete!
O fenómeno durou cerca de 30 minutos.

Inédito?

27 janeiro 2006

Festa de Toiros e Liberdade

Se eu perguntasse a um comunista de cultura média o que, no fundo, representa a Festa de Toiros, ele responder-me-ia que a capacidade do homem para interferir com sucesso sobre as forças da Natureza.
O que o meu virtual interlocutor não descortinaria é que a resposta dada entra em manifesta contradição com a ideologia marxista, base filosófica do comunismo.
Se a Festa de Toiros representa a interferência bem sucedida do homem sobre a Natureza, então esta não é um destino fatal ao qual nos tenhamos que submeter inexoravelmente. Mas, como tenho defendido em vários textos neste Blog, o comunismo é um fatalismo porque «...tende na direcção de um Estado à escala mundial, [...] a forma mais completa e acabada do totalitarismo integral» (Charles Lagrave, Lectures Françaises, mars, 1999).
Em termos intelectuais, não se pode pensar que se o peso das esquerdas sobre a nossa Sociedade progredisse e alcançasse o poder, coabitaria com a Festa de Toiros cuja mensagem mais intrínseca é a da liberdade.
Eis por que motivo agora se percebe que todo o ataque cerrado à Festa Brava nunca venha da direita política, mas de amplos sectores controlados de perto ou à distância pelas esquerdas, embora a maioria esmagadora dos detractores não tenha consciência do que diz e faz. Isto mesmo é condição sine qua non para a boa consecução da tenebrosa estratégia.

26 janeiro 2006

Novas freguesias arquivadas

A ideia peregrina de criar novas freguesias morreu, diz o presidente da junta de Alcochete a um jornal regional.
A ideia vinha de trás, como devem saber. E não nascera naquela junta – que fez ouvidos de mercador – mas na câmara.
Só me admira a persistência de uma política coxa, que em nada difere da anterior, celebrizada como sendo de cuco.
Jamais haverá democracia participativa se quem governa continuar a enviar recados por interpostos meios.

O esgoto

Quando, por incúria do homem, um rio é mero cano de esgoto, o resultado é este: o estuário do Tejo continua entre os mais poluídos da Europa.
A fonte de poluição por mercúrio está agora mais perto de Alcochete.
Convém ler também esta informação esclarecedora. E ainda esta do Parlamento Europeu.
Continuem a banhar-se e a pescar nestas águas...

Recomendação de leitura (6)

Que se saiba, até ao momento a situação financeira da câmara de Ourique é o caso mais grave do mandato autárquico terminado em Outubro. Os dados revelados nesta notícia são esclarecedores.
Confesso a minha surpresa, não pela notícia – que nem sequer é inédita, pois em 2002 a câmara de Setúbal estava também insolvente – mas pelo contributo de órgãos do Estado para este estado de coisas.
Por onde andaram, até Outubro, a Inspecção-Geral de Finanças (IGF), a Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT), o Tribunal de Contas (TC), a oposição autárquica e os cidadãos de Ourique? Que poder local é este?
Importa recordar que o líder do anterior executivo ouriquense era social-democrata e o novo é socialista.
Admito que a celeridade da investigação derive da gravidade do caso, mas não posso deixar de estranhar que, perante denúncias públicas de gestão duvidosa noutras autarquias, IGF, IGAT e TC não actuem imediatamente.
Qualquer que seja a militância partidária dos intervenientes, cabe a esses organismos, em primeira instância, apurar se alguém põe precipitadamente em causa a honra de eleitos locais ou se nas denúncias há algo mais que fumo.

25 janeiro 2006

Recomendação de leitura (5)

É importante ler esta notícia na íntegra, relacionada com a revisão da lei das finanças locais.
Parecem-me boas perpectivas para o município de Alcochete, excepto se, uma vez mais, houver aumento de encargos para os contribuintes.
Preocupa-me a omissão de qualquer referência a regras mais severas de aprovação de investimentos e de gestão das finanças. É que os encargos com juros e amortizações estão controlados, mas o endividamento corrente não.
Achei particularmente divertido que, na entrevista, sejam focados aspectos (como a criação de novas freguesias) que, há meses, eram argumento eleitoralista no largo de São João. Quem o inventou teve a resposta na altura certa e eu mantenho a convicção de que, em política, pior cego é quem não quer ver.

Outro assunto abordado na edição de hoje do DN – protecção de crianças e jovens em risco – corrobora o que escrevi no passado dia 19. O erro é mesmo do sistema, porque sem ovos os técnicos não podem fazer a omeleta.

Para finalizar, leiam esta notícia, cujo tema é totalmente distinto.
E nós, que temos a sede da Reserva Natural do Estuário do Tejo e, sem bairrismo, maior variedade de aves para observar, estamos à espera de quê?
Não é preciso inventar nada. Há exemplos de sobra por essa Europa fora. E fundos comunitários sempre houve e continuará a haver.
Deitem mãos à obra, caramba!

24 janeiro 2006

Boas ideias

A ideia expressa nesta notícia parece-me positiva, embora, conhecendo algumas das pessoas citadas, duvide que das discussões saia mais luz que faíscas. Mas, por vezes, também estas são úteis para abanar o sistema.
Um pouco por todo o país têm surgido ideias semelhantes. Prevalecem duas tendências: designar um provedor do munícipe ou um conselho de "senadores".
As funções não são exactamente as mesmas, mas qualquer das hipóteses me parece positiva.
Em Alcochete, via debate electrónico, alguém sugeriu, em tempos, um conselho municipal. Pelo menos as candidaturas do CDS e da CDU repescaram a sugestão, em Outubro, para os respectivos programas eleitorais.
O CDS ficou fora dos órgãos municipais mas a CDU detém a maioria.
Depreendo do programa desta coligação estar fixado como limite o final de 2006 para a criação de um "Conselho Municipal, como o órgão máximo de promoção e da participação dos cidadãos, na lógica de uma democracia participada".
Por definição, democracia participada é a que envolve o poder e os cidadãos na tomada de decisões, embora o actual executivo, até ao momento, tenha preferido algo muito diferente.
Em face da burocracia e da lentidão da administração autárquica, talvez um ano seja prazo demasiado longo para criar o tal Conselho Municipal.
A experiência pode ser positiva e, quem sabe, passível de inclusão na legislação autárquica, cuja revisão está prevista para o ano corrente.
Por todas as razões recomendaria alguma antecipação, porque quanto mais tempo houver melhor se avaliarão benefícios e inconvenientes desse órgão de consulta e aconselhamento dos executivos da câmara e da assembleia municipal.

23 janeiro 2006

Ou fado ou comunismo

O fado não é um destino fatal, mas alívio à dor.
Alívio à dor do fado que pesa sobre os portugueses, sem que, ainda, se vislumbre um fim para o longo pesadelo.
Que pesadelo?
Há muito tempo, séculos talvez, que o povo português é impedido de expandir todas as suas potencialidades humanas por meia dúzia de tubarões que aproveitam o próprio Estado para a perpetuação deste cárcere infernal.
O fado é fado porque denuncia este triste fatum que é ausência de liberdade. Eis a razão por que ninguém se deve surpreender que as raízes do fado sejam eminentemente religiosas e cristãs.
A liberdade é o principal sustentáculo do Cristianismo porque neste o homem faz o seu próprio destino. Disse Jesus Cristo ao paralítico: «levanta-te e anda» (João, 5, 8). Paralíticos somos todos nós quando ficamos parados à espera de uma saída providencial para as aflições da vida.
Essa saída providencial é encarnada no Estado pelas esquerdas, unidas pelo marxismo, filosofia do comunismo.
Assim, eu pergunto: o que é que liga o fado ao comunismo? Nada! Então voltemos ao título desta nótula e concluamos: ou fado ou comunismo.

Os autocarros

Se e quando esta notícia se confirmar, concretiza-se uma das bandeiras eleitorais da CDU em Samouco.
A principal bandeira era a solução do caso da extensão do centro de saúde, acerca do qual o candidato hoje em maioria na junta de freguesia recorda, no vídeo da campanha, nunca antes a coligação ter prometido a construção de um centro de saúde. Mas acrescenta o seguinte: "temos soluções intermédias para resolver este caso". Deriva daí o que escrevi noutro texto precedente.
A alteração da circulação de autocarros – que o anterior executivo municipal decidira de modo pouco pacífico e, creio, nunca totalmente concretizado – era outra bandeira. Note-se que a solução agora prevista chegou a ser equacionada, embora considerada inviável devido à indisciplina no estacionamento.
Oxalá câmara e junta tenham conseguido o que antes parecia impossível.

A propósito de autocarros, pergunto: quando as obras da 2.ª fase da variante estiverem concluídas continuarão a circular pelo interior da Urbanização dos Barris, em Alcochete, situada nas imediações da Escola EB El-Rei D. Manuel I?
Se a resposta for afirmativa, contem com a firme oposição dos residentes por causa do desassossego.
O ruído e a poluição das 06h00 às 02h00 da madrugada de todos os dias, a algazarra e a depredação causadas pela miudagem nas paredes e grelhas de protecção dos sistemas de ventilação situados das imediações de uma das paragens implantadas na Rua da Escola Secundária, já levaram algumas pessoas a pôr a casa à venda. Outras, não menos saturadas, adiaram a decisão apenas porque as primeiras continuam sem comprador.
Seja a resposta positiva ou negativa, no mínimo o município deve reparar os estragos visíveis em propriedade privada.

Arruma? Desarruma?

De três, duas: ou Luís Franco presume que basta algum ruído para mostrar que governa a câmara; ou está a tentar reescrever os manuais de marketing político; ou ao autor desta notícia nunca explicaram a fórmula mágica da comunicação jornalística: "qqocq".
Trocada em miúdos a fórmula traduz-se da seguinte forma: que, quem, onde, como e quando.

Franco "arruma" Alcochete?
Discute-se o quê em matéria de planeamento e ordenamento do território?
Uma boa oportunidade de "colocar um conjunto de questões sobre o ordenamento territorial"? Quais?

Não, não creio que este seja o rumo político correcto. Por este andar é "vira o disco e toca o mesmo"! Cuidado: não passaram sequer 100 dias!

Transcrevo, enfim, a segunda de inúmeras citações constantes do programa eleitoral da CDU à Câmara Municipal, atribuída a Hannah Arendt:
"Nada no nosso tempo é mais duvidoso, penso eu, do que a nossa atitude perante o mundo. (…) Pois o mundo não é humano só por ser feito de seres humanos, e não se torna humano só por nele se fazer ouvir a voz humana, mas sim, e só, quando se torna objecto de diálogo. Por muito que as coisas do mundo nos afectem, por muito profundamente que nos abalem e nos estimulem, só se tornam humanas para nós quando podemos discuti-las com o nosso semelhante."

Alcochete e as presidenciais

Números globais do concelho nas presidenciais de 2006:
Inscritos ..................................11.162 eleitores

Votantes ................................. 6.996
Abstiveram-se ........................ 4.166 (37,32%)
Votos brancos ........................ 78
Votos nulos ............................. 57

Votos expressos:
Cavaco Silva ................ 2.245
Manuel Alegre .............. 1.959
Jerónimo de Sousa ...... 1.520
Mário Soares ................. 758
Francisco Louçã ........... 343
Garcia Pereira ............... 36

A ordem dos candidatos é idêntica nas três freguesias.

Apenas dois comentários acerca dos resultados locais:
- Manuel Alegre é exemplo de que os alcochetanos (e os portugueses em geral) estão-se nas tintas para as estratégias partidárias;
- Alcochete não é feudo da esquerda.

22 janeiro 2006

Não é a saúde que falha, são as pessoas

Não dispondo o Estado de receitas suficientes para subsidiar todos os projectos que os 308 municípios lhe apresentam anualmente, os autarcas têm de ser sensatos na definição de prioridades.
A experiência mostra, há vários anos, ser prudente que o poder local se abstraia de ambições eleitoralistas e seleccione os projectos a financiar pela administração central em função da satisfação de necessidades básicas ou da utilidade dos empreendimentos para o maior número de cidadãos.
Para reavivar a memória, eis alguns dados factuais.
O Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC) em 2006 prevê para investimentos em Alcochete as seguintes verbas: 52.865 euros para a construção da nova biblioteca pública; 35.000 euros para o reapetrechamento da Escola EB El-Rei D. Manuel I e mais 174.340 euros para construção do respectivo pavilhão desportivo; 109.829 euros para a alteração do entroncamento da EN4 com a via de acesso ao centro de estágio do Sporting; 100.000 euros para apetrechamento da Escola Secundária de Alcochete e 51.656 euros para a remodelação do parque escolar.
Em 2005, o mesmo PIDDAC reservava ao concelho de Alcochete 94.500 euros para a nova biblioteca pública; 247.479 euros para o pavilhão gimnodesportivo da Escola EB El-Rei D. Manuel I; 34.860 euros para a alteração do entroncamento da EN4 com a via de acesso ao centro de estágio do Sporting e 154.500 euros para o apetrechamento da Escola Secundária de Alcochete.
E em 2004 foram reservados 33.750 euros para a biblioteca pública; 25.000 euros para o entroncamento da EN4; 470.000 euros para a construção da Escola Secundária; 17.273 euros para a remodelação e conservação do parque escolar e 149.640 euros para a construção da sede da Sociedade Filarmónica Progresso e Labor Samouquense.
Somem-se a isto 650.000 euros aplicados pelo Estado na construção do fórum cultural – cuja obra financiou em 32,5% do valor inicialmente orçamentado – mais o que será investido na construção de uma avenida a que, pomposamente, chamaram Variante Urbana.
Nestes três anos o Estado cativou para Alcochete verbas destinadas a obras não imprescindíveis e mal planeadas que ultrapassam 1.100.000 euros, enquanto continuam sem solução problemas antigos e prementes, tais como os das extensões de saúde de Samouco e São Francisco (que, em conjunto, servem quase 4.000 pessoas), assunto focado nesta notícia do jornal «Sem Mais».
Suponho que a quarta parte da verba cativada para obras dispensáveis em face das limitações orçamentais do Estado seria suficiente para dotar ambas as freguesias de instalações de saúde com um mínimo de condições funcionais.
O populismo para consumo local parece-me inútil – até porque, a médio prazo, tem efeitos contraproducentes – e os recados ao poder só têm algum efeito se transmitidos nos meios de comunicação de expansão nacional.
Há que combater o isolamento de quem se situa a 30kms do Terreiro do Paço, refinar os métodos de contacto e de comunicação e agir mais ao nível institucional (membros do Governo, deputados da oposição, etc.) ou, como passado, influenciar as pessoas certas na hora exacta.
Pelo menos desde os anos 60 que, salvo raras excepções, as principais obras que o Estado financiou em Alcochete resultaram da intervenção directa de dois tipos de pessoas: das que tinham raízes locais e ascenderam a órgãos de decisão do poder central ou das que, desconhecendo o concelho, foram convidadas a observar a realidade, compreenderam os argumentos dos autarcas e ficaram sensibilizadas.
Daí que me pareça estéril e condenada ao insucesso a via reivindicativa e populista detectada na notícia cuja hiperligação forneço acima. Suponho que a solução depende, sobretudo, da capacidade de persuasão, de persistência e da racionalidade de argumentos.
Vale a pena recordar uma história curiosa, passada há menos de quatro anos, relacionada com o posto de combustíveis construído a poucas dezenas de metros de edifícios de habitação e de uma escola, na Urbanização dos Barris, em Alcochete.
Após ter prometido, em campanha eleitoral, recusar o licenciamento da obra, poucos meses depois o presidente da câmara então recém-eleito declarava-se impossibilitado de o fazer, devido a compromissos legais assumidos pelo antecessor. Provavelmente, teria sido possível dar a volta ao problema por outra via: o presidente da empresa petrolífera proprietária do posto era pessoa que conhece muitíssimo bem o concelho. É filho de uma alcochetana e de um homem a quem Alcochete ficou a dever alguma coisa nas décadas de 50 e 60, tendo na juventude passado férias numa propriedade então situada a poucas centenas metros do local onde hoje está o posto de combustíveis que, com toda a probabilidade, terá sido uma das dezenas de justificações para a derrota eleitoral do presidente da câmara eleito em finais de 2001.
Que tem isso a ver com as extensões de saúde de Samouco e São Francisco?
Se houvesse algum relacionamento regular entre eleitos e eleitores; se a recepção aos novos moradores fosse mais que propaganda e autopromoção; se houvesse a preocupação de conhecer o perfil profissional dos novos residentes e de os sensibilizar para problemas locais pendentes, descobrir-se-ia existir uma reserva estratégica eventualmente útil mas inaproveitada: habitam em Alcochete inúmeras pessoas importantes em múltiplas ocasiões. Algumas têm intervenção directa e indirecta em centros de decisão do Estado.
Lá diz o ditado: "quem não tem cão, caça com gato".

20 janeiro 2006

Para memória futura (2)

Vale a pena registar, para memória futura, um excerto do discurso do presidente da Câmara Municipal de Alcochete, proferido na cerimónia de atribuição de galardões de mérito do município, no passado dia 15:
“Este Executivo, de que muito me orgulho de presidir, irá esforçar-se, que ninguém duvide, por deixar uma indelével marca na prossecução do desenvolvimento harmonioso e sustentado (…) em todas as áreas indispensáveis para a satisfação das necessidades dos naturais e residentes neste Concelho”.
Prometo não me esquecer da promessa e espero que nos possamos congratular por isso no final do mandato. A esperança é a última a morrer. Costumo acreditar nas pessoas, até prova em contrário.
Já agora, uma saudação especial aos funcionários autárquicos agraciados com a Medalha de Bons Serviços, por terem 30 ou mais anos de dedicação e serviço: Maria Luísa Pinto Canastreiro Chagas, Margarida Júlia Belo Quaresma Trindade, Maria Fernanda Simões Oliveira Bastos, José Francisco Frade Texugo, José Mata do Vale, Diamantino da Cruz, Ludovico António Tirolete Brissos.
Quão interessantes deverão ser as suas memórias! Camaradas jornalistas com órgão de comunicação social: toca a desvendá-las antes que se reformem!

19 janeiro 2006

Reflexão para um Projecto Educativo de Escola

Segundo tenho conhecimento, muitos trabalhos para a elaboração de Projectos Educativos de Escola privilegiam um instrumento frequentemente utilizado em Sociologia, vale dizer, o inquérito.
O inquérito não deve ser uma prioridade de trabalho para Projectos Educativos, mas apenas um recurso ancilar.
O que pergunto é o seguinte: há uma ideia de Projecto Educativo para as comunidades escolares? Eis uma questão que considero vertical e prioritária à via horizontalista do inquérito.
A espinha dorsal de um Projecto Educativo deve ser a atenção dada à componente lectiva que por sua vez estará ao serviço do modelo ocidental de democracia cuja charneira é a liberdade.
Um Projecto Educativo não deve circunscrever-se apenas à melhoria de aspectos exteriores (higiene, instalações, equipamentos, etc.) de um estabelecimento de ensino, mas sobretudo apresentar estratégias sérias para a consciencialização da disciplina como um bem, superando fobias, aparentemente inexplicáveis, que impedem a responsabilização dos jovens pelas consequências dos próprios actos. Mas por que razão isto acontece?
Eu defendo que uma Sociedade, sob o peso das esquerdas, vê ameaçado o sentido da responsabilidade.
As esquerdas estão vocacionadas para o fortalecimento da vontade geral cujo termo fatal e necessário é a supremacia do Estado sobre as mais ínfimas movimentações do indivíduo.
Nesta conformidade, ninguém pode escapar aos desígnios do Estado como se este fosse um destino implacável.
Assim sendo, amortece o sentido de responsabilidade no indivíduo que é levado, consciente ou inconscientemente, a pensar que o Estado, qual bom pai, tudo resolve. Eis o móbil básico da desresponsabilização geral.
Incapazes de coragem para descer às causas mais profundas das coisas, psicólogos e sociólogos, à boa maneira romântica de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), operam intelectualmente e em campo no sentido de que o indivíduo nasce bom, mas que a Sociedade o degrada. Este é o tópico bem disseminado em milhentos textos escolhidos para os vários manuais dos alunos por pseudo-intelectuais. Ora não é possível exigir aos jovens responsabilidade e submetê-los à ideia de que a Sociedade é origem fatídica de degradação generalizada.
Urge que um Projecto Educativo contribua para a convicção a interiorizar pelos jovens de que a Sociedade não traça o destino, mas que este é construção de cada um. Só assim é possível a responsabilidade em vez da demissão.
Finalmente, nenhum Projecto Educativo poderá fugir à reivindicação da autoridade e dignidade do professor em função de um serviço à comunidade a fim de que não assistamos ao colapso desta com o da própria escola no sentido de instituição.

Sociedade à beira do precipício

Como qualquer cidadão não indiferente aos problemas da sociedade, acompanho com atenção o noticiário acerca de crianças e jovens em risco.
Desde o caso extremo da aldeia de Figueira (Portimão), aos mais recentes de Porto, Gaia e Viseu, creio ter lido quase tudo o que a Imprensa publicou.
Sobre o caso de Viseu existe já um relatório preliminar oficial, no qual instituições do Estado lavam daí as mãos e apontam o dedo à respectiva Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco.
Achei a atitude estranha e precipitada mas não me surpreendo porque, dia sim, dia não, os representantes do Estado fazem de conta caber às estruturas por eles criadas a responsabilidade exclusiva da execução das suas directrizes. Ninguém cuida de avaliar, rigorosamente, se o erro está na lei ou nos executores. E é sempre mais fácil fazer como Pilatos: atribuir as culpas aos elos fracos da cadeia.
Acabei de ler, no «Jornal de Notícias», a confirmação das minhas suspeitas de que o cerne do problema reside na metodologia de constituição e funcionamento das comissões de protecção de crianças e jovens em risco.
Que tem isto a ver com Alcochete? Mais do que a maioria possa supor, por haver inúmeros motivos de preocupação. Acerca da constituição e do funcionamento da comissão municipal, cujos serviços de atendimento estão instalados no edifício da Casa do Povo de Alcochete, ouvi há meses o suficiente a alguém que dela fazia parte.
Fiquei surpreendido e, perante o que acabo de ler no «Jornal de Notícias», pergunto se será necessário acontecer alguma desgraça para que os alcochetanos passem da indiferença à acção.
Suponho que este "blog" é lido por quem mo relatou e convido-o a dar público testemunho do que sabe.
Não, caro leitor, não deite o problema para trás das costas. Ele não é da responsabilidade da entidade administrativa Município de Alcochete, nem dos seus eleitos. A sociedade compõe-se de avós, pais e filhos e todos têm alguma coisa a ver com problemas que fingem ignorar.

17 janeiro 2006

Do comunismo ao abismo

Em termos ideológicos, a expiação é uma categoria fulcral do Cristianismo alheia ao comunismo.
Para expiar um crime, urge a confissão (declaração) seguida de contrição (arrependimento). Ora esta conversão interior (mudança) é visceralmente estranha ao marxismo, matriz de todas as esquerdas.
Posso garantir aos leitores dos meus textos que, na generalidade, os intelectuais comunistas detestam o tema intrínseco a Crime e Castigo do escritor russo Fiodor Dostoievsky (1821-1881). Esse tema é a expiação.
A obra de Dostoievsky, entranhadamente religiosa, faz-nos ver as profundezas insuspeitadas da alma do povo russo, afigurando-se-me, aparentemente, inexplicável que, poucos anos depois da morte do grande romancista, a Rússia entrasse numa revolução para mudar o sentido do Universo.
Essa mutação radical dos mais altos valores humanos à escala planetária que, contra a ingenuidade de alguns, continua a perdurar, não olha a meios para atingir os fins, socorrendo-se por toda a parte do próprio crime. Muitas pessoas vêem nisto a aplicação mais maquiavélica do maquiavelismo, o que é tanto mais verdade quanto menos explica as coisas.
Nicolau Maquiavel (1469-1527), nefasto fundador da prática política como hoje a conhecemos, inspirou-se na lição gnóstica, sempre combatida pela Igreja, mas nunca extirpada definitivamente do subsolo cultural da nossa civilização.
O gnóstico achava que não havia barreira moral ao cometimento de quaisquer crimes desde que ele e Deus fossem um.
Ora nos tempos modernos Deus é substituído pelo Partido. Em nome deste tudo se faz, inclusive os maiores crimes, porque ideologia e consciência são uma e a mesma coisa. Aqui não pode haver arrependimento. Sem este não há expiação. Só o abismo.

E nós com o rio tão perto...


Leiam esta notícia e digam lá se seria necessário virem indicações e fundos de Bruxelas relacionados com a navegação fluvial. Qualquer ser inteligente que contempla o rio pensou nisto inúmeras vezes, sem nunca compreender porque nos limitámos, há décadas, a fazer dele um imenso esgoto.
Atenção ao teor da notícia original (em inglês e francês), que pode ser lida aqui.

Decisões contestáveis

Escrevi há dias sobre o preço da água e deparei hoje, no «PortugalDiário», com novos dados sobre a questão.
Esta notícia é muitíssimo esclarecedora. Tal como na península de Setúbal, criou-se em Trás-os-Montes uma empresa intermunicipal. Esta fornecerá serviços de abastecimento de água e de tratamento de esgotos a preços muitíssimo superiores aos vigentes.
Por estas paragens o assunto continua a ser tabu, mas autarcas transmontanos chamam a atenção para diferenças de custos que ninguém ponderou em devido tempo.
É muito fácil o Estado e as suas empresas imporem novos encargos aos cidadãos. Será impossível fazer melhor pelo mesmo preço?
Há neste negócio das Arábias da água e dos esgotos – nacionalizado, nosso – um mínimo de lógica e racionalidade?

Auditoria mantém-se

É sempre útil os cidadãos estarem atentos e exigirem explicações aos seus eleitos, conforme, mais uma vez, fica demonstrado com esta notícia.
Em conferência de imprensa, membros do executivo da coligação vencedora em Alcochete nas últimas eleições autárquicas confirmaram ontem a intenção programática de pedir uma auditoria às contas do município.
Embora as declarações registadas pelo «Jornal de Notícias» não respondam ao essencial – se o executivo anterior omitiu ou não informação relevante aos eleitos e aos cidadãos – oxalá a auditoria vá ao fundo da questão.
Estranho, uma vez mais, que o executivo municipal se limite a enviar recados através da comunicação social, quando deveria comunicar directamente com os cidadãos, no mínimo, através do canal privilegiado para o efeito.

A auditoria ao município de Alcochete (2)

É indiscutível que, no passado dia 9 de Outubro, os cidadãos julgaram politicamente a acção do anterior executivo municipal, remetendo-o a uma posição minoritária no actual mandato.
Contudo, após a tomada de posse do novo executivo vieram a público factos que carecem de esclarecimento pelos eleitos no mandato anterior. Sejam denúncias caluniosas, difamações ou factos comprováveis em sede própria, em qualquer dos casos há punição prevista.
Em substância, até agora são do domínio público os seguintes factos:
1. O que consta da introdução ao programa eleitoral da CDU de Alcochete, já citado em texto anterior;
2. Os enunciados neste texto, elaborado com base em declarações atribuídas pela comunicação social a membros do actual executivo.
Correm rumores sobre outros aspectos mas, por agora, não passam disso.
São aplicáveis aos factos conhecidos disposições do Código Penal e da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, que tipifica crimes de responsabilidade que titulares de cargos públicos cometam no exercício das suas funções, bem como as sanções que lhes são aplicáveis e os respectivos efeitos.
Segundo a definição legal, um membro de órgão representativo de autarquia local desempenha um cargo político, independentemente de ter ou não funções executivas.
O artigo 2.º da citada Lei n.º 34/87 considera "praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções, além dos como tais previstos na presente lei, os previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício ou os que mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres".
O art.º 5.º (Agravação especial) menciona que "a pena aplicável aos crimes previstos na lei penal geral, que tenham sido cometidos por titular de cargo político no exercício das suas funções e qualificados como crimes de responsabilidade nos termos da presente lei, será agravada de um quarto dos seus limites mínimo e máximo".
O art.º 11.º (Prevaricação) estatui que "o titular de cargo que conscientemente conduzir ou decidir contra direito um processo em que intervenha no exercício das suas funções, com a intenção de por essa forma prejudicar ou beneficiar alguém, será punido com prisão de dois a oito anos".
Para o caso vertente é especialmente relevante o art.º 14.º (Violação de normas de execução orçamental), cuja redacção transcrevo na íntegra:
"O titular de cargo político a quem, por dever do seu cargo, incumba dar cumprimento a normas de execução orçamental e conscientemente as viole:
"a) Contraindo encargos não permitidos por lei;
"b) Autorizando pagamentos sem o visto do Tribunal de Contas legalmente exigido;
"c) Autorizando ou promovendo operações de tesouraria ou alterações orçamentais proibidas por lei.
"Será punido com prisão até um ano".

Tenha-se também em conta o art.º 15.º (Suspensão ou restrição ilícitas de direitos, liberdades e garantias): "O titular de cargo político que, com flagrante desvio das suas funções ou com grave violação dos inerentes deveres, suspender o exercício de direitos, liberdades e garantias não susceptíveis de suspensão, ou sem recurso legítimo aos estados de sítio ou de emergência ou impedir ou restringir aquele exercício, com violação grave das regras de execução do estado declarado, será condenado a prisão de dois a oito anos, se ao facto não corresponder pena mais grave por força de outra disposição legal".
Salto para o art.º 26.º (Abuso de poderes), que estatui o seguinte:
"1 - O titular de cargo político que abusar dos poderes ou violar os deveres inerentes às suas funções, com a intenção de obter, para si ou para terceiro, um benefício ilegítimo ou de causar um prejuízo a outrem, será punido com prisão de seis meses a três anos ou multa de 50 a 100 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
"2 - Incorre nas penas previstas no número anterior o titular de cargo político que efectuar fraudulentamente concessões ou celebrar contratos em benefício de terceiro ou em prejuízo do Estado".

O art.º 29.º (Efeitos das penas aplicadas a titulares de cargos políticos de natureza electiva), abrangendo qualquer membro de órgão representativo de autarquia local, determina: "Implica a perda do respectivo mandato a condenação definitiva por crime de responsabilidade cometido no exercício das suas funções dos seguintes titulares de cargo político".
O art.º 41.º (Direito de Acção) determina que, "nos crimes a que se refere a presente lei, têm legitimidade para promover o processo penal o Ministério Público, sem prejuízo do especialmente disposto nas disposições do presente capítulo e, em subordinação a ele:
"a) O cidadão ou a entidade directamente ofendidos pelo acto considerado delituoso;
"b) Qualquer membro de assembleia deliberativa, relativamente aos crimes imputados a titulares de cargos políticos que, individualmente ou através do respectivo órgão, respondam perante aquela;
"c) As entidades a quem incumba a tutela sobre órgãos políticos, relativamente aos crimes imputados a titulares do órgão tutelado;
"d) A entidade a quem compete a exoneração de titular de cargo político, relativamente aos crimes imputados a este".

Não menos importante para o caso é o art.º 44.º, que pune a denúncia caluniosa:
"1- Da decisão que absolver o acusado por crime de responsabilidade cometido por titular de cargo político no exercício das suas funções ou que o condene com base em factos diversos dos constantes da denúncia será dado conhecimento imediato ao Ministério Público, para o efeito de procedimento, se julgar ser esse o caso, pelo crime previsto e punido pelo artigo 408.º do Código Penal.
"2 - As penas cominadas por aquela disposição legal serão agravadas, nos termos gerais, em razão do acréscimo da gravidade que empresta à natureza caluniosa de denúncia a qualidade do ofendido".

Em face dos casos do domínio público e da legislação transcrita, há ou não matéria suceptível de sanção judicial?
Provavelmente sim, mas só aos tribunais cabe apreciar os factos e lavrar a respectiva sentença. Se comprovado, um dos factos conhecidos tem punição prevista: um ano de prisão. Se outros aspectos puderem ser provados as penas variam (de multa a prisão de 2 a 8 anos), tendo ainda a autarquia a possibilidade de ser indemnizada por danos patrimoniais.
Se nada se provar, resta aos visados agir em defesa da honra.

Porque em matéria desta delicadeza nem a calúnia nem o abuso de poder são aceitáveis, por estarem em causa a honra e a dignidade de pessoas e o prestígio e o património da instituição municipal, com ou sem auditoria importa que este processo prossiga nos órgãos competentes.
Quem pode dar início ao processo? O Estado, o Ministério Público, a câmara municipal, a assembleia municipal ou qualquer partido político com ou sem representação nos órgãos locais. Inclusive um grupo de cidadãos, através de petição popular.
Faça-se justiça para que a culpa não morra solteira e jamais se repitam coisas destas.

16 janeiro 2006

A auditoria ao município de Alcochete (1)

Retorno à questão da auditoria ao município – anunciada pela coligação CDU no programa de acção submetido ao sufrágio dos eleitores do passado 9 de Outubro, assunto abordado neste texto – e ao silêncio dos eleitos no mandato anterior sobre matéria que não pode nem deve cair no esquecimento: conheciam ou não pormenores da gestão e o estado das finanças municipais? Se desconheciam, por que não denunciaram a indisponibilidade de informação relevante às entidades fiscalizadoras e judiciais competentes? Que os levou a omitir aos cidadãos, nomeadamente através dos meios de comunicação social, a inexistência de informação suficiente?
Socorro-me de legislação que o cidadão comum desconhece mas que os eleitos locais não podem nem deviam ignorar, para demonstrar existirem mecanismos legais suficientes para agir.
Desculpem a extensão do texto (dividido em dois capítulos), amplamente justificada pela importância intrínseca do tema.
Principiemos pelo Estatuto dos Eleitos Locais (Lei n.º 29/87, de 30 de Junho), cujo art.º 4.º (Deveres), na redacção actual estatui o seguinte:
"No exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento dos seguintes princípios:
"1 - Em matéria de legalidade e direitos dos cidadãos:
"a) Observar escrupulosamente as normas legais e regulamentares aplicáveis aos actos por si praticados ou pelos órgãos a que pertencem;
"b) Cumprir e fazer cumprir as normas constitucionais e legais relativas à defesa dos interesses e direitos dos cidadãos no âmbito das suas competências;
"c) Actuar com justiça e imparcialidade.
"2 - Em matéria de prossecução do interesse público:
"a) Salvaguardar e defender os interesses públicos do Estado e da respectiva autarquia;
"b) Respeitar o fim público dos poderes em que se encontram investidos;
"c) Não patrocinar interesses particulares próprios ou de terceiros de qualquer natureza quer no exercício das suas funções quer invocando a qualidade de membro de órgão autárquico.
"Não interferir em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado, nem participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção, por si ou como representante ou gestor de negócios de outra pessoa, ou em que tenha interesse ou intervenção em idênticas qualidades o seu cônjuge, parente ou afim em linha recta ou até ao 2.º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;
"e) ........ [texto irrelevante para o caso];
"f) Não usar para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções.
"3 - Em matéria de funcionamento dos órgãos de que sejam titulares:
"a) Participar nas reuniões ordinárias e extraordinárias dos órgãos autárquicos;
"b) Participar em todos os organismos onde estão em representação do município ou da freguesia".
Em matéria de Direitos, o art.º 5.º, alínea g), estatui ainda que os eleitos locais gozam de "livre circulação em lugares públicos de acesso condicionado quando em exercício das respectivas funções". A alínea o) estatui terem direito a "solicitar o auxílio de quaisquer autoridades, sempre que o exijam os interesses da respectiva autarquia local"; a alínea p) que gozam da "protecção conferida pela lei penal aos titulares de cargos públicos" e a alínea q) que gozam de "apoio nos processos judiciais que tenham como causa o exercício das respectivas funções".


Consequentemente, em matéria de deveres e direitos os eleitos locais gozam de prerrogativas para agir quando consideram estarem em causa interesses da autarquia e dos cidadãos.

Mas há muito mais em matéria legislativa aplicável aos eleitos locais.
Vejamos o importantíssimo Estatuto do Direito de Oposição (Lei n.º 24/98, de 26 de Maio), cujo art.º 1.º estatui ser "assegurado às minorias o direito de constituir e exercer uma oposição democrática [...] das autarquias locais de natureza representativa, nos termos da Constituição e da lei".
O art.º 2.º da mesma lei (Conteúdo) tem a seguinte redacção actual:
"1 - Entende-se por oposição a actividade de acompanhamento, fiscalização e crítica das orientações políticas [...] das autarquias locais de natureza representativa.
"2 - O direito de oposição integra os direitos, poderes e prerrogativas previstos na Constituição e na lei.
"3 - Os partidos políticos representados [...] em quaisquer outras assembleias designadas por eleição directa relativamente aos correspondentes executivos de que não façam parte, exercem ainda o seu direito de oposição através dos direitos, poderes e prerrogativas concedidos pela Constituição, pela lei ou pelo respectivo regimento interno aos seus deputados e representações".
Expressamente, o art.º 3.º (Titularidade), estatui serem "titulares do direito de oposição os partidos políticos representados [...] nos órgãos deliberativos das autarquias locais e que não estejam representados no correspondente órgão executivo"; serem "também titulares do direito de oposição os partidos políticos representados nas câmaras municipais, desde que nenhum dos seus representantes assuma pelouros, poderes delegados ou outras formas de responsabilidade directa e imediata pelo exercício de funções executivas" e a "titularidade do direito de oposição é ainda reconhecida aos grupos de cidadãos eleitores que como tal estejam representados em qualquer órgão autárquico [...]".

Repare-se ainda na redacção do n.º 4 deste artigo: "O disposto na presente lei não prejudica o direito geral de oposição democrática dos partidos políticos ou de outras minorias sem representação em qualquer dos órgãos referidos nos números anteriores, nos termos da Constituição".

Passemos ao art.º 4.º (Direito à informação):
"1 - Os titulares do direito de oposição têm o direito de ser informados regular e directamente pelos correspondentes órgãos executivos sobre o andamento dos principais assuntos de interesse público relacionados com a sua actividade.
"2 - As informações devem ser prestadas directamente e em prazo razoável, aos órgãos ou estruturas representativas dos partidos políticos e demais titulares do direito de oposição".
O art.º 5.º (Direito de consulta prévia) estatui que "os partidos políticos representados nos órgãos deliberativos das autarquias locais e que não façam parte dos correspondentes órgãos executivos, ou que neles não assumam pelouros, poderes delegados ou outras formas de responsabilidade directa e imediata pelo exercício de funções executivas, têm o direito de ser ouvidos sobre as propostas dos respectivos orçamentos e planos de actividade".
O art.º 6.º (Direito de participação) menciona que "os partidos políticos da oposição têm o direito de se pronunciar e intervir pelos meios constitucionais e legais sobre quaisquer questões de interesse público relevante, bem como o direito de presença e participação em todos os actos e actividades oficiais que, pela sua natureza, o justifiquem".
O art.º 8º (Direito de depor) estatui que "os partidos políticos da oposição têm o direito de, através de representantes por si livremente designados, depor perante quaisquer comissões constituídas para a realização de livros brancos, relatórios, inquéritos, inspecções, sindicâncias ou outras formas de averiguação de factos sobre matérias de relevante interesse nacional, regional ou local".

Chamo ainda a atenção para o teor do ar.º 10.º (Relatórios de avaliação), que me parece não estar a ser respeitado na autarquia municipal de Alcochete:
"1 - O Governo e os órgãos executivos das regiões autónomas e das autarquias locais elaboram,até ao fim de Março do ano subsequente àquele a que se refiram, relatórios de avaliação do grau de observância do respeito pelos direitos e garantias constantes da presente lei.
"2 - Esses relatórios são enviados aos titulares do direito de oposição a fim de que sobre eles se pronunciem.
"3 - A pedido de qualquer dos titulares mencionados no número anterior, podem os respectivos relatório e resposta ser objecto de discussão pública na correspondente assembleia".

Salto o n.º 4, que não tem aplicação nas autarquias locais, chamando a atenção para o teor do parágrafo seguinte:
"5 - Os relatórios referidos nos números anteriores são publicados [...] no diário ou boletim municipal respectivo, conforme os casos".

Alguém viu, até hoje, este relatório de avaliação regularmente publicado nos órgãos informativos do município?

Fica para o próximo capítulo a tipificação dos crimes dos titulares de cargos públicos.

15 janeiro 2006

O comunismo é um fatalismo

A filosofia do comunismo é o marxismo, sistema doutrinário segundo o qual é a produção dos bens materiais que condiciona a vida social, intelectual e política.
O marxismo não cai do céu. Procede do Iluminismo que arvora a razão num imperativo fatal.
O iluminismo é um produto do humanismo antropocêntrico que descentra a ideia infinita de Deus para colocar no lugar d'Este o homem, isto é, a finitude da criatura.
Se recorrermos a um dos representantes máximos do humanismo, Giovani Pico della Mirandola (1463-1496) e lermos o primeiro parágrafo do Discurso sobre a Dignidade do Homem, edições 70, Lisboa, 1998, deparamos logo com a absoluta centralidade do homem: «Li nos escritos dos Árabes, venerandos Padres, que, interrogado Abdala Sarraceno sobre qual fosse a seus olhos o espectáculo mais maravilhoso neste cenário do mundo, tinha respondido que nada via de mais admirável do que o homem». Aqui começa, para os tempos modernos, o fatalismo que estreitará cada vez mais as saídas até aos dias de hoje.
O humanismo antropocêntrico deflagra sobretudo a partir da tomada de Constantinopla pelos Turcos em 1453, marco histórico para o fim da Idade Média. Ao longo dos quase mil anos desta, logo a partir do séc. II, a Igreja travou as veleidades do Gnosticismo, já eminentemente materialista e antropocêntrico.
Os gnósticos defendem que só uma elite se salva, contra a perdição do grosso dos homens. Este fatalismo inexorável tem raízes na concepção grega de destino (moira) ao qual se submetem os homens juntamente com os deuses.
Eis sucintamente o percurso retrospectivo de uma civilização que é a nossa, isto é, a civilização ocidental e cristã cuja bandeira mais alta é a da liberdade. Isto significa que o cristão faz o seu próprio destino. Nesta senda, o Cristianismo nunca pode ser comensal do marxismo porque este pugna por uma organização político-económica dirigida pelo Estado - qual deus - como termo fatal da evolução social.

13 janeiro 2006

Entrevista do presidente da câmara

Li com natural atenção a entrevista concedida pelo presidente da Câmara Municipal de Alcochete ao «Jornal do Montijo», edição n.º 334, datada de hoje (sem página activa na Internet).
Há nove dias escrevia aqui que, até prova em contrário, todos os eleitos no mandato anterior são solidários com o estado das finanças municipais, havendo instrumentos legais para exigir a informação necessária se ela não foi voluntariamente distribuída por quem detinha o poder executivo.
Após ler esta entrevista reforço a convicção de que até o maior partido da oposição (em 2002/2005 com 3 vereadores e 9 deputados municipais) ignorava o estado real das finanças camarárias, possuía informação vaga e dispersa sobre dívidas, arrancou às cegas para a campanha eleitoral e tinha um programa recheado de compromissos políticos que, apenas três meses volvidos, parecem em grande parte infundados e irrealizáveis.
Como foi isto possível e porquê é a explicação que toda a classe política eleita no anterior mandato deveria apresentar quanto antes. Que poder local é este? Que confiança devemos depositar nas instituições se os nossos legítimos representantes desconhecem documentos e informação a que têm acesso por direito legal?
Estranho também a ausência nesta entrevista de qualquer referência à anunciada auditoria às finanças camarárias, promessa inscrita na introdução ao programa eleitoral da coligação vencedora a 9 de Outubro: "Para a CDU, estes quatro anos afastados da gestão das autarquias foram anos difíceis, penosos mesmo, ao vermos o desperdício de oportunidades e de dinheiros públicos com obras 'emblemáticas' da imponderação do executivo PS e com contratações principescas de um 'rol de assessores' que afogam as finanças da Câmara Municipal de Alcochete e às quais tem de ser feita uma rigorosa auditoria, tal deve ser o seu descalabro".
Houve desperdício de dinheiro público? Houve contratação principesca de assessores? Houve descalabro? Em que ficamos: há ou não auditoria?
Se não há auditoria, acreditamos nos argumentos de quem fez o mal ou em quem lançou atoardas?
Finalmente, breve referência a uma alusão à dependência municipal da receita extraordinária oriunda da Freeport, se for concedida a licença de utilização do "outlet". Considero lastimável que, além das vicissitudes suficientemente conhecidas (se bem se recordam algumas envolvem polícia e tribunais), ao nível do poder local o empreendimento continue a ser encarado como a vaca leiteira de Alcochete.
Se isto não parece uma república bananal, macacos me mordam!

Ordem na água


O assunto tratado nesta notícia é demasiado sério para ser ignorado. Suponho que a maioria da população ainda bebe água da torneira.
Mais me espanta que só no princípio de 2006 se saiba algo tão grave passado em 2004.
Há dias escrevi sobre o preço da água de consumo público, a pretexto de declarações de alguém que deveria ter pensado duas vezes antes de falar.
Mais estranho é que se ouse preconizar a revisão geral de preços, invocando um falso argumento de equidade, sem que ninguém cuide de repor a legalidade na realização e divulgação de análises de qualidade.
O Decreto-Lei n.º 243/2001, de 5 de Setembro, é o documento nacional de referência para todas as entidades ligadas à captação, tratamento, armazenagem e distribuição de água ao domicílio. Embora publicado há mais de quatro anos, a sua aplicação é imperativa desde o dia de Natal de 2003.
Da alínea h) do art.º 8.º do citado decreto, consta o seguinte: "Publicitar, trimestralmente, no caso de água fornecida a partir de uma rede de distribuição, por meio de editais afixados nos lugares próprios ou por publicação na imprensa regional, os resultados obtidos nas análises de demonstração de conformidade, acompanhados de elementos informativos que permitam avaliar do grau de cumprimento das normas de qualidade (...)".
Em Alcochete, até meados de 2004, a câmara não divulgava regularmente os resultados das análises à água de consumo humano. As análises existiam mas ficavam somente para conhecimento interno.
Um dia correu o boato de que a água de Alcochete era de má qualidade, alguém confrontou o presidente da câmara com os factos e a lei e, daí em diante, os resultados passaram a ser afixados – tanto quanto me apercebi com a regularidade legal prevista – apenas nas vitrinas que o município instalou em vários pontos do concelho.
Como a lei não contempla, expressamente, o uso de sítios das câmaras na Internet como meio de divulgação, os resultados jamais foram conhecidos através desse veículo rápido, directo e em crescente expansão. Não esqueçamos, por exemplo, que em mais de 40% dos lares portugueses há um computador e que o acesso à Internet registava, no final do 3.º trimestre do ano passado, 1,211 milhões de clientes residenciais (crescendo ao ritmo de 6,5% a 7% por trimestre).
Importa, assim, concretizar promessas eleitorais da coligação vencedora, tais como "Garantir que os cidadãos-munícipes e que os parceiros institucionais tenham acesso à informação relevante da Câmara Municipal e das Juntas de Freguesia" e "Assegurar a qualidade da informação, bem como assistência e apoio aos cidadãos na compreensão das políticas autárquicas", assunto abordado em texto precedente.
Espero, pois, que informação tão relevante não se limite às vitrinas, mesmo que a lei não obrigue a tal.

Homenagem a António Rei

É um erro trágico pensar que o poeta, no acto da escrita, se põe acima da visão que tem do homem e do mundo. Esta ideia alienante é responsável por o sentido dos textos nos passar ao lado.
O poeta não é um homem acima dos homens, mas entre homens (homo inter homines). Ele é puxavante de um projecto que propõe à tribo. E das duas, uma: ou ele deseja que o mundo melhore ou deseja acabar com o mundo e mostrar outro que ninguém vê excepto os muito inteligentes como na história de "O rei vai nu".
Se o poeta deseja que este mundo melhore, é ramo novo do tronco comum. Aqui percebemo-lo porque o seu poema é uma contínua anagnórise, isto é, reconhecimento.
Se o poeta quer destronar o Criador e colocar-se no lugar d'Ele, recusa o recebido, ou seja, recusa a intertextualidade, diálogo entre textos, para instaurar a intratextualidade que autotexto é. Aqui ele só olha para si próprio como criança para o espelho e diz: "espelho, espelho meu, há deus maior do que eu?"
O poeta António Rei, homem simples de tantas lides comuns, soube, como ninguém, descer às raízes mais profundas da alcochetanidade, mostrá-las aos seus conterrâneos e nós vimo-las, declamamo-las, cantamo-las para que jamais nos esqueçamos que a humildade é a verdade da criação artística. Esta não quer destruir o mundo, mas colaborar na sua construção, denunciando toda a injustiça.

12 janeiro 2006

Galardões de mérito

Já escrevi aqui sobre este assunto. Sabe-se agora quem são os galardoados com as medalhas de mérito do município, cuja cerimónia se realizará no próximo dia 15.
Quanto à medalha D. Manuel I, não posso estar mais de acordo: um médico nonagenário, uma fadista e um poeta a quem muito devemos.
Por desconhecimento dos fundamentos acerca dos distinguidos com a medalha de bons serviços (funcionários autárquicos), não me pronuncio.

Medalha Dom Manuel I:
Doutor Manuel Simões Arrôs
Maria Leopoldina da Guia
António Rei

Medalha de Bons Serviços:
Diamantino da Cruz
José Francisco Frade Texugo
José Mata do Vale
Ludovico António Tirolete Brissos
Margarida Júlia Belo Quaresma Trindade
Maria Fernanda Simões Oliveira Bastos
Maria Luísa Pinto Canastreiro Chagas


Recomendação de leitura (3)

Recomendo a leitura desta notícia. Os factos não se passaram na Nova Zelândia, mas em Sesimbra, aqui tão perto.
Isto vem a propósito do que escrevi aqui, que continua sem resposta.
Não me recordo, nos últimos cinco anos, de algum vereador, deputado municipal, grupo de cidadãos ou partido terem exigido documentação similar à Câmara Municipal de Alcochete, informação imprescindível para haver alguma noção do estado de coisas na autarquia.
A fundamentação legal, invocada pelos deputados do BE de Sesimbra, está correcta. Apenas o prazo é errado: a resposta a um requerimento de consulta a documentos administrativos tem de ser fornecida em 10 dias e não em 15.
O sítio na Internet da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos é esclarecedor para quem tenha dúvidas.
Transcrevo ainda, para memória futura, o teor do art.º 11.º da Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 8/95 de 29 de Março e pela Lei n.º 94/99, 16 de Julho.
E pergunto: isto está a ser respeitado entre nós?

"Publicações de documentos
"1 - A Administração Pública publicará, por forma adequada:
"a) Todos os documentos, designadamente despachos normativos internos, circulares e orientações, que comportem enquadramento da actividade administrativa;
"b) A enunciação de todos os documentos que comportem interpretação de direito positivo ou descrição de procedimento administrativo, mencionando, designadamente, o seu título, matéria, data, origem e local onde podem ser consultados.
"2 - A publicação e o anúncio de documentos deve efectuar-se com a periodicidade máxima de seis meses e em moldes que incentivem o regular acesso dos interessados".


Dura lex, sed lex!!!

11 janeiro 2006

Aprendam "capelinhas" de Alcochete!

Dois bons exemplos de acção política acertada em tempos de democracia electrónica: o sítio dos autarcas sociais democratas de Montijo e o respectivo blogue.
Lucília Ferra é, além do mais, mulher de armas e ideias. E vai chegar onde deseja, certamente, daqui a quatro anos. Pelo menos está a seguir o rumo certo.
Aprendam "capelinhas" de Alcochete, cujas portas se abrem e fecham apenas nos períodos eleitorais. Aqui já se escreveu o suficiente sobre o assunto: três meses depois, bom exemplo a copiar e o mais disperso em vários textos.
Possivelmente a maioria das nossas "capelinhas" continuará encerrada, pelo menos até ao Outono, por haver eleições internas à vista.

Sei que numa delas se prepara a limpeza em três fases, coisa para uns dois anos, no mínimo!

Raízes, Ressurgimento e Presidenciais

Só é possível um povo ressurgir se se reconsciencializa das respectivas raízes. Estas são de matriz cristã no caso do povo português. Ora como é que essa reconsciencialização vira realidade se paira sobre a nossa sociedade o peso das ideologias de esquerda, intrinsecamente marxistas?
As raízes culturais do povo português ascendem a um princípio de ordem superior negado pelo marxismo, razão por que este não pode ir ao encontro daquelas. Se assim é, como o povo português poderá ressurgir?
O ressurgimento do povo português reclama o recuo das esquerdas e o regresso à nossa identidade forjada ao longo de quase nove séculos de História.
Por outro lado, o carácter sebastiânico do candidato a Presidente da República Cavaco Silva desconfortabiliza-me porque tal traço, quiçá doentio da nossa cultura, só favorece as esquerdas.
Desde as Descobertas que meia dúzia de tubarões em torno do Estado tomaram as rédeas de Portugal até aos dias de hoje. Esta rede castradora de vampiros não foi tolhida com a legalização dos partidos de esquerda em Portugal depois do 25 de Abril, antes foi favorecida porque o marxismo defende o colectivismo dirigido pelo Estado como o termo fatal e necessário da evolução social, intelectual e política.
Desde Alcácer Quibir até hoje vimos apostando em salvadores de toda a espécie, aposta de viabilidade impossível porque a História não pode sancionar qualquer saída assente numa visão menor do homem e do mundo.
Urge, portanto, que todos nós tomemos nas mãos o destino «da Lusitânia antiga liberdade» (Camões) e ergamos Portugal ao merecido lugar entre as nações.

Nota 11 para velhotes em acção

Daria, em princípio, nota 15 a iniciativas como a referida nesta notícia, não fossem dois pormenores relevantes: a maioria dos potenciais interessados desconhece-a porque a câmara não a divulgou convenientemente, e presumo tratar-se da continuidade de algo vindo do anterior executivo mas agora para uma faixa etária mais ampla.
Assim, considero a iniciativa positiva mas fico-me pela nota 11.
Vi esta notícia num jornal do distrito pouco lido no concelho. No jornal local, com data muito próxima deste, nada encontrei. E no sítio da câmara na Internet nada se publicou, até hoje.
Contudo, no labiríntico sítio da câmara – de que não posso fornecer hiperligação para determinada página por culpa de quem pariu aquilo – na área Desporto existe um plano de actividades para 2005(!) do programa Clube+Idade, presumivelmente oriundo do anterior executivo, então para cidadãos com mais de 60 anos. A diferença mais notória é que, a partir de agora, destina-se a quem tenha mais de 55 anos. Nada de inédito, portanto.
A contragosto, insisto em que o município continua a pecar por falta de informação directa. Não pode nem deve perpetuar essa falha por muito tempo, por vários motivos, alguns dos quais aflorados em textos anteriores.
Eis chegada a minha hora de cobrar as primeiras promessas eleitorais, para que considero não haver desculpa por terem decorrido menos de 100 dias. Manda o bom senso que estas coisas da informação pública sejam arrumadas na fase de transição.
Cito o ponto 3 do capítulo VII do programa da CDU de Alcochete nas recentes eleições autárquicas: "Garantir que os cidadãos-munícipes e que os parceiros institucionais tenham acesso à informação relevante da Câmara Municipal e das Juntas de Freguesia".
Cito outras alíneas do mesmo ponto:
"c. Assegurar a qualidade da informação, bem como assistência e apoio aos cidadãos na compreensão das políticas autárquicas;
(i.) Assegurar a publicação periódica e regular do Boletim Municipal;
(ii.) Garantir a permanente actualização de conteúdos do sítio da Câmara Municipal".
Até agora a câmara não nos deu nem informação relevante nem suficiente, à maioria é difícil compreender políticas autárquicas pouco claras e mal explicadas e a actualização de conteúdos do sítio da câmara tem-se resumido a meia dúzia de linhas semanais.
Creio, todavia, que o Boletim Municipal mencionado no programa da CDU era uma revista. Possivelmente aquela colorida, com "n" fotografias dos srs. presidentes e vereadores com funções executivas (e os não executivos cuidadosamente "rapados", por serem peçonhentos), que calculo custar uns 45.000 euros por edição.
Mas não é desse instrumento de propaganda que carecemos, que nunca me pareceu coerente excepto para fins de promoção pessoal a expensas do erário público. Hoje, quando há défice orçamental declarado, parece-me até impensável.
Não vejo outra solução para massificar a informação que não seja explorar exaustivamente todos os meios disponíveis: Rádio, Imprensa e Internet.
Mas isso ainda não basta. É preciso produzir e distribuir nas caixas de correio dos munícipes um boletim mensal em papel, com uma só cor e sem imagens se não houver dinheiro para mais. É fácil (muito fácil mesmo), é barato e... dá votos.
Num boletim municipal como este, editado pela maior autarquia do país (se tem o programa Acrobat Reader instalado no computador leia qualquer dos exemplares em versão electrónica), diz-se e explica-se tudo.
Só tem vantagens: é fácil de elaborar e paginar em computador (até com um vulgar processador de texto), imprime-se em Alcochete a baixo custo, a distribuição em todos os endereços postais do concelho tem um custo aceitável e... dá votos.
Ponham mãos à obra e depressa, antes que seja tarde.

10 janeiro 2006

Negócio malcheiroso

Nesta notícia levanta-se uma ponta do manto diáfano da fantasia que rodeia o aparecimento no distrito de uma empresa multimunicipal de tratamento de esgotos domésticos (Simarsul). Mais uma opção política não explicada nem justificada, tanto pelo Estado como pela nossa autarquia, também envolvida no processo.
As autarquias são minoritárias no capital da Simarsul, detendo a maioria uma empresa de contornos mal conhecidos (AdP), cuja utilidade económica, social e ambiental carece de adequada demonstração.
Há oito anos que o município do Barreiro tinha projecto de construção de ETAR, gerida por ela própria. Estado opôs-se e obrigou a integrar o projecto num sistema multimunicipal, gerido por nova empresa cujo funcionamento foi mais que precário nos últimos anos. Agora só em 2009 haverá solução.
Explicações precisam-se, porque isto implica um acréscimo de despesas para os munícipes e as vantagens práticas estão por esclarecer.

Diz quem sabe: Rio Frio preferível à Ota

Eu, que nada percebo de administração de aeroportos mas frequentei dezenas deles ao longo da vida, li o estudo citado nesta notícia e concluí que técnicos especializados na matéria também aconselham a opção Rio Frio para a construção do novo aeroporto de Lisboa.
Chamei a atenção para o facto, há quase dois meses, neste texto.
Leiam com atenção a notícia citada acima, com origem num antigo conselheiro de Obras Públicas, e reparem em pormenores como:
- Guterres optou pela Ota para construir o Novo Aeroporto de Lisboa. A opção foi política e contrariou pareceres técnicos;
- Foi engendrada a questão ambiental, com a alegação de que a União Europeia não financiaria parte do projecto de Rio Frio por causa dos sobreiros;
- Além das limitações técnicas da Ota, Rio Frio é cem milhões de contos mais barato;
- Quais os verdadeiros motivos que levaram à opção Ota? A especulação imobiliária dos terrenos parece pouco. Será que tudo isto é para urbanizar Rio Frio?

09 janeiro 2006

À mentira brutal oponhamos a verdade frágil

Atendendo à situação vivida pela nossa sociedade, eu penso que só com o discurso da verdade é possível contribuir para a mudança de qualquer coisa, ainda que eu tenha a perfeita consciência de que corro riscos.
Eu sou licenciado em Línguas e Literaturas Modernas na variante de Estudos Portugueses e professor de Língua e Literatura Portuguesas há mais de vinte anos, mas nunca percebi poetas como Ramos Rosa, Gastão Cruz, Herberto Helder... Deste último arrisco a transcrição de um poema: «Bate na madeira vermelha/bate uma pedra com o buraco aberto à exaltação/da lua, bate onde/espumejam as ribeiras que atravessam/as embocaduras/siderais. E a madeira/levanta-se, chameja a pedra astrológica, cerra-se/a água nos cântaros de lava./A altas atmosferas bate nas estâncias negras./E eu durmo com o sangue luzindo na boca/O ritmo lunar muda-me os sonhos./O rosto queima-se»
Vivi sempre com a ideia de que a inteligibilidade de versos em publicações como Árvore, Cadernos do Meio-Dia, Poesia 61, etc., me fugia por minha incapacidade, até que, em 1997, começa a minha reflexão sobre a categoria tempo que mudará o meu olhar sobre toda a Literatura à escala nacional e mundial.
Sem me ocupar aqui de nostalgias doentias, quem faz poesia vira-se para o futuro na continuidade do fio da memória ou em ruptura com ele.
Se um texto mantém diálogo com as grandes obras que o precedem, fala comigo; se, em vez desse diálogo, ironiza, parodia e subverte por sistema as referências culturais, cai na assemanticidade e torna-se ininteligível para mim. Mas quem faz estes textos?
Esses textos são feitos por pessoas que, mais ou menos declaradamente, defendem uma filosofia materialista da História, istó é, o marxismo. Este não pode recorrer aos valores do passado porque são obstáculo à tarefa de destruição do mundo para emergir outro dos escombros.
O pensamento materializa-se na linguagem. Esta é um valor que afirma os valores. Se, no poema, por exemplo, amor quer dizer ódio, altero o sentido das palavras, com estas os valores e atrás destes a minha forma de pensar o homem e o mundo. Eis como se destrói o verbo (logos) para destruir uma herança civilizacional de dois mil anos.

Estão a atirar-nos água para os olhos


Provavelmente, esta e esta notícias escaparam a muitos. Mas vale a pena lê-las.
Detenhamo-nos no caso de Alcochete. Toda a água de uso público consumida no concelho tem origem em captações próprias do município. Poucos sabem que, na Fonte da Senhora, parte dela é cedida à freguesia da Atalaia, no concelho de Montijo.
Será que, em tais condições, os critérios de justiça e igualdade mencionados nas notícias – que “não haja uns a pagar para outros”, segundo o argumento – têm justificação em Alcochete? Os municípes de Alcochete serão obrigados a financiar o descontrolo administrativo nos serviços de águas e saneamento da Grande Lisboa?
A anunciada aplicação de uma banda tarifária de 40 cêntimos a 1,30 euros tem sérias implicações na carteira dos consumidores alcochetanos, nomeadamente dos pobres e da classe média.
Presentemente, o nosso município aplica ao consumo doméstico bandas tarifárias de 0,26 cêntimos a 1,5 euros, dependendo do volume de água consumida.
O aumento anunciado para o primeiro escalão de consumo doméstico será, em Alcochete, de 53,8%, enquanto no último há uma redução de 13,4%. Ou seja, os mais pobres (que consomem menos) vão pagar muitíssimo mais e os maiores gastadores verão, provavelmente, reduzida a factura a pagar.
Haverá nisto critérios de justiça e de equidade ou alguém está a atirar-nos água para os olhos?
Concordaria se se anunciasse a criação de uma rede de distribuição de água à escala nacional, com uma banda tarifária única e justa, controlo apertado da gestão e dos lucros e partilha de recursos entre os que têm e não têm aquíferos suficientes.
Mas não é essa a solução invocada. É, simplesmente, para que “não haja uns a pagar para outros”... Será que amadorenses, oeirenses e sintrenses pagam hoje a água consumida em Alcochete?
Resta ainda saber o que sucederá com as taxas de saneamento e de recolha de resíduos sólidos urbanos, na maioria dos municípios (e no nosso também) indexada ao preço da água.
Esse tem sido assunto tabu em Alcochete, onde se anunciou até hoje, somente, a construção de uma nova ETAR pela Simarsul. Soube há tempos, por alguém que está hoje no executivo camarário, que a nova estação implicará um aumento significativo da taxa de saneamento. Desafio a câmara a revelar os valores contratados com a Simarsul pelo anterior executivo.
Caso nunca tenham reparado nas parcelas da vossa factura da água, aqui fica um exemplo de Alcochete: a uma factura mensal de 6,11 euros de consumo de água, adicionam-se 2 euros de quota de disponibilidade de serviço e 3,06 euros de saneamento e recolha de lixo.
Tudo somado, incluindo o IVA (5%), temos uma factura cujo valor é praticamente o dobro da verba atribuída apenas ao consumo de água.
Amanhã escreverei sobre a electricidade, onde também há curto-circuito.

Três meses depois

Enquanto alguns safados preparam meticulosamente o terreno para melhores dias, três meses depois das eleições autárquicas não há sinal de nada.
Só que não estamos nos anos de noventa e menos nos de oitenta. Hoje com um computador ligado à Net, pode-se fazer uma revolução, sendo cada vez mais despicienda a ideia esquerdista de que um homem só não faz história.
Se estes autarcas tão bem conhecidos por todos nós julgam que o dinheiro dos contribuintes é só para ordenadões, estão muito mal enganados. Denunciá-los-ei a centenas de particulares, às colectividades do Concelho e a todas as organizações e instâncias do poder que considerar convenientes.
Depois, temos variadíssimos jornais; temos múltiplos sites no nosso distrito e outros a nível nacional que se prestam à denúncia de tudo o que se opuser ao bem comum; temos, por fim, os blogs, nomeadamente "Praia dos Moinhos", ao nosso dispor tanto quanto cremos pensar.
Acabou o ano 2005, difícil para Portugal e um dos piores para a História de Alcochete depois do 25 de Abril. É meu desejo e o de muita gente que 2006 seja melhor, embora no plano autárquico eu não tenha quaisquer ilusões porque não há comunismo honesto.

A esquerda e o passado

No texto imediatamente anterior, quis dizer e sou forçado a manter em abono da verdade que a esquerda recusa o recebido pela Humanidade desde a bruma dos tempos.
Entre os ditos valores da esquerda e os que fizeram a Civilização Ocidental e Cristã não há união possível, embora, por exemplo, no plano jurídico possa e deva haver um espaço de comunicação para preservar a paz entre os homens.
Mas o facto de a esquerda não ter condições para escutar o recebido por força do fundo marxista que lhe é intrínseco, não invalida que ela pegue no passado ora para a desconstrução, ora para o alcance de fins inconfessáveis.
No que respeita à desconstrução criminosa dos valores dos nossos maiores, não há biblioteca no mundo, por maior que seja, com capacidade para albergar tudo o que foi escrito e gravado só nos últimos cem anos.
Se algum leitor dos meus textos deseja que eu lhe forneça, ao menos, um exemplo dessa desconstrução de lesa-humanidade, leia o poema "O Cristo" de O Canto e as Armas de Manuel Alegre.
Relativamente à utilização do passado sob a capa da Cultura ao serviço de estratégias políticas, convém saber que a esquerda de hoje colhe a melhor lição de António Gramsci (1891-1937), marxista italiano. Este filósofo defende que o melhor método para a vitória do socialismo à escala planetária assenta na apropriação e alteração dos códigos culturais do povo antes da grande revolução no campo económico.
E pronto, aqui fica aquela dimensão das coisas que faltava ao meu último texto.