Neste começo do séc. XXI, eu diria que a mais perigosa das alienações é política, consistindo na subestimação das categorias direita e esquerda.
Pessoas de pensamento circunspecto defendem em política a acção pragmática, ao fim e ao cabo benquista à esquerda, pois esta o que diz hoje poderá não dizer amanhã, o que faz hoje poderá não fazer amanhã. E porquê assim? Porque o político de esquerda é um homem de ruptura com o recebido, isto é, sem compromissos. Ora é a este descomprometimento que se chama pragmatismo.
O político que se reclama de direita nunca pode fazer tábua rasa dos valores que a tradição arrasta, razão por que em importantes sectores do PSD-PPD e no CDS-PP descortina-se um fio condutor na defesa da respublica que chega a ter qualquer coisa de doutrinário.
Esta incapacidade para se saber o que é a direita e a esquerda leva-nos ao cumprimento do dever dominical e simultaneamente votar em partidos cujos valores jamais podem estar ao lado dos religiosos porque onde estão aqueles não podem estar estes e vice-versa.
Por exemplo, no campo da minha especialidade, a Literatura, não vejo como esta arte do tempo possa ser percebida sem uma clara distinção do que é a direita e a esquerda.
Quando não entendemos um poeta, não é porque o pensamento deste esteja para lá do comum dos mortais, mas porque não há qualquer possibilidade de comunicação com o emissor cuja ruptura com o legado e desconstrução da própria linguagem o torna insondável. O mesmo é válido para a pintura dos últimos decénios, teatro, escultura, etc.
Mas a distinção fulcral entre direita e esquerda está no modo de encarar a economia: a primeira defende o livre mercado e a segunda reforça o peso do Estado sobre a vida dos cidadãos. Ora é aqui que eu vislumbro a vitória da visão liberal do homem e do mundo porque em países de forte implantação esquerdista (América Latina) não é banido o livre mercado nem a propriedade privada, embora toda a análise neste campo, na minha perspectiva, se deva manter cautelosa.
Em síntese, deixar de ver as coisas à luz dada pelas categorias direita e esquerda é deixar que outros as vejam por nós e nos transformem num rebanho de carneiros.
4 comentários:
Caro amigo:
começo a perceber porque é que a visão cristã do mundo (que defende na sua versão medieval, veja-se a sua incapacidade de compreender a revolução cartesiana, que envolve erros científicos graves)... prossiguemos: ... porque é que a visão cristã do mundo se associa tão pacificamente à economia neo-liberal e à consequente defesa uma legislação laboral minimalista ou, na versão radical, inexistente. É que assim se fabricam mais e mais pobrezinhos a quem, as almas pias e iluminadas pelo Bem Absoluto podem dar ESMOLA, a bem da salvação da sua (própria) alma... É: o INFERNO é para os outros... (Sartre que me perdoe)
De resto, concordo consigo numa coisa: "há ideias perigosas". As suas são disso um belo exemplo.
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