Retorno à base quando já se conhece o texto integral do discurso proferido pelo Presidente da República no parlamento. Recomendo a sua leitura atenta para se entender o alcance do que seguidamente escrevo.
Também em Alcochete é necessário lançar um olhar sobre a sociedade, implantar a verdadeira democracia, reforçar a intervenção e o prestígio das instituições e dos seus titulares, confrontar os cidadãos com os sonhos de uma sociedade mais justa e equilibrada que marcaram o 25 de Abril e questioná-los sobre a realidade actual, porque os benefícios do desenvolvimento não contemplam todos e muito menos a maioria.
Temos em Alcochete muitos dos problemas apontados por Cavaco Silva no seu discurso.
Incompreensíveis critérios de desenvolvimento: esgotam-se os poucos recursos disponíveis em obras públicas faraónicas, embora a meia dúzia de quilómetros de distância haja milhares de residentes com infra-estruturas básicas do séc. XIX.
Não se vislumbra o menor sinal de empenho em fixar empresas que dêem ocupação à mão-de-obra qualificada e aos jovens. Até o pouco comércio de proximidade continua a encerrar e a desaparecer.
O tecido económico e social é cada vez mais frágil, faltam creches e escolas, aumentam as bolsas de pobreza e a exclusão social.
Urbanizamos sem qualidade, sem cuidar do bem estar nem da dimensão humana. Os novos residentes estão desenraízados e descontentes porque trabalham a muitos quilómetros de distância. Paralelamente, os centros históricos esvaziam-se e degradam-se e desvaloriza-se o único património da esmagadora maioria das famílias – a habitação própria – embora os impostos sobre ele incidentes continuem a aumentar.
Somos social e culturalmente arcaicos a pensar e a agir. Deixamo-nos iludir com facilidade. Somos enganados, quase diariamente, mas aceitamo-lo sem contestação perceptível.
Somos uma sociedade apática e indiferente ao défice democrático: incapaz de se organizar, de reagir e de exigir transparência a um poder que continua longe de prestigiar as instituições e a democracia.
Não sabemos usar a liberdade conquistada com o 25 de Abril e estamos cada vez mais longe de construir a sociedade justa e equilibrada.
"Todos somos responsáveis, todos temos que assumir a quota-parte de responsabilidade social que nos cabe como cidadãos. Assumir como desígnio colectivo a protecção dos que vão resvalando, lenta e invisivelmente, para a margem de uma sociedade que se quer competitiva e dinâmica, mas também justa e inclusiva.
"Temos de romper com o conformismo e o comodismo de relegar para o Estado a única solução do problema.
"Temos de conseguir enaltecer, através de uma nova atitude cívica, o exemplo de milhares de cidadãos que, através do voluntariado e da participação em instituições de solidariedade social, encontram um sentido para esse desígnio.
"Mas temos também a obrigação de reconhecer que a melhoria da justiça social, o combate à pobreza e à exclusão exigem que o País volte a ganhar a batalha do investimento, do crescimento económico, da criação de riqueza, sem o que o sonho continuará adiado" – disse o Presidente da República há dois dias.
Acreditem: é preciso fazer um novo 25 de Abril em Alcochete. Mas com todos e não somente com os do costume!
5 comentários:
Sr. Bastos, eu estou com todo o espírito e dinâmica que impregnam o seu texto.
Quero chamar a atenção para estes dois parágrafos do discurso:
“Iludimo-nos pela presença deste ou daquele equipamento social, fruto do voluntarismo do poder local e dos homens bons que não abandonaram as suas terras, mas tardamos a encontrar um rumo de desenvolvimento sustentável (leia-se desenvolvimentos ambiental, económico e social) (…) que potencie os parcos recursos existentes, (…) que atraia novos recursos materiais e humanos”.
“Estou convencido de que, em relação a este objectivo da inclusão social – tão central à dignidade da pessoa humana - é possível identificar os problemas mais graves e substituir o eterno combate ideológico (acrescente-se esquerda e direita) por uma ordenação de prioridades, metas e acções, em que todos se possam rever e participar”.
O anónimo é Luis Pereira
Luís, as categorias políticas direita e esquerda não são nenhuma história da carochinha, mas realidades verdadeiramente intrínsecas ao ser humano desde que este se viu como tal.
A própria Bíblia recua a um princípio ou até a um pré-tempo ou não tempo presidido por Deus (in principio creavit Deus caelum et terram), projectando-se, no fim, para o futuro, mas para se perceber uma obra como o Apocalipse é preciso conhecer toda a tradição bíblica.
Fico com a impressão de que a tua visão do homem e do mundo é mais pragmática e pouco ou nada teórica. Ora teoria e prática têm que estar equilibradamente unidas para a consecução do tão almejado avanço da sociedade. Sempre que isso não acontece, favorecendo uma ou outra, estamos a dar trunfos à esquerda através de um idealismo estéril ou de um pragmatismo escravizante.
Acabei de ler o discurso do sr. Presidente da República, Dr. Aníbal Cavaco Silva.
Não posso concordar com a forma de transcrição de dois parágrafos do mesmo discurso levada a cabo por Luís Pereira, pois parenteticamente insere interpretações pessoais das palavras do sr. Presidente que este não proferiu, podendo levar incautos leitores a pensar que são da autoria do Supremo Magistrado da Nação.
Aproveito para deixar neste blog mais uma vez a ideia de que por mais pragmático que um ministro ou autarca sejam, não é possível que se despojem de uma ideia política de direita ou esquerda.
Por exemplo, eu defendo que a denominação a dar à Escola Secundária de Alcochete seja "Dr. José Grilo Evangelista". Ora nesta posição de muita gente não há nada de inocente, razão por que os comunistas discordam, invocando as demagogias do costuma.
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