No passado Outubro faltaram dinheiro, organização, projectos e líderanças que justificassem votações significativas nos partidos à direita e à esquerda do tradicional eixo alcochetano CDU-PS. Naturalmente, o PCP e os independentes com ele alinhados eram a alternativa.
Para o inêxito dos partidos fora desse eixo contribuíram também dois problemas conhecidos: muitos dos novos moradores (que representam já metade da população) não estão recenseados em Alcochete e quase 40% dos inscritos nos cadernos eleitorais ficaram em casa.
Ambos os problemas radicam num outro ainda mais delicado: à população urbana, chegada após a abertura da ponte Vasco da Gama, interessa pouco, ou mesmo nada, o que há para além do prédio onde habita. Distanciada da realidade e dos problemas locais, preocupada sobretudo com o emprego, as prestações e a família, vive noutro planeta.
O desinteresse explica a abstenção elevada. Em meia dúzia de anos, Alcochete passou de vila pacata a dormitório igual aos outros, sem que o poder local tenha mexido um dedo para o evitar.
Regressando ao universo do eixo político tradicional alcochetano, as quatro principais causas da derrota do PCP em 2001 – divisões internas, pressões exteriores, pessoal camarário e Freeport – foram as mesmas que ditaram idêntica sorte ao poder socialista, no passado mês de Outubro.
Detendo então uma maioria confortável nos órgãos do município, no início de 2004 o PS local começou a ser minado por divergências internas. No Outono desse ano esteve para ocorrer uma cisão no grupo dos seus eleitos locais, que só não foi avante, aparentemente, para evitar a repetição de fenómeno semelhante, ocorrido pouco mais de dois anos antes, com os eleitos da CDU. Ainda agora o problema parece longe de uma solução.
A segunda causa da derrota socialista nas eleições de Outubro – pressões exteriores – é melhor conhecida. A arrogância e a prepotência de alguns destacados membros do poder e seus apaniguados, em múltiplas circunstâncias e meios, disparando em todas as direcções, foi imprevidente e prejudicial à sua imagem.
Não me custa a crer que, pouco antes das eleições, o chefe da edilidade fosse o autarca mais impopular do distrito, segundo sondagem que um dos partidos locais diz ter na sua posse. Prejudicado também por motivos de outra índole, cujos efeitos são devastadores em meios pequenos de comadres e primos, onde o boato queima até inocentes na praça pública.
Nesse período o PCP aproveitou o vento bonançoso e intensificou a circulação de boletins informativos nas caixas de correio, beliscando o adversário nas partes fracas. E, no início de 2005, quando desencadeia contactos e pressões junto da população sensível, das colectividades e dos funcionários da câmara, apercebe-se que o adversário político teria de lutar muito e bem cedo para se agarrar ao poder.
Mas este não fez nada disso, deixando quase tudo para as vésperas da campanha. Cumprida de forma atabalhoada e, inevitavelmente, desastrosa.
O pessoal camarário e as colectividades foram o terceiro motivo da derrota socialista de Outubro. O caso das colectividades é simples: sempre que falta dinheiro no montepio começam os problemas.
As receitas da autarquia evoluíram abaixo dos seus compromissos e necessidades e, desde o ano passado, foi necessário apertar mais o cinto. As dívidas de curto prazo subiram acentuadamente, prejudicando outra faixa populacional sensível no concelho e na região: a dos pequenos empresários fornecedores da câmara.
No caso dos funcionários municipais, tenho dificuldade em entender que vantagens espera qualquer executivo retirar de relações tensas com subordinados. Os riscos parecem-me óbvios, mormente se o executivo se rodeia de um núcleo duro de assessores, controversos e bem pagos, gente que para o pessoal do quadro será sempre mercenária.
Com isso a porta ficou entreaberta para o PCP agitar as massas. Os funcionários da câmara valem mais de um milhar de votos.
Quarta e última causa da derrota socialista: Freeport e Misericórdia.
Em Fevereiro de 2005, quando a Polícia Judiciária esteve em Alcochete a apreender documentação e computadores em vários locais, incluindo os paços do concelho, a muralha socialista sofreu outro sério rombo.
Cinco meses depois, foram a GNR e o tribunal a dar cabo do resto ao pararem à força as obras de construção da nova biblioteca pública, devido a providência cautelar interposta pela Santa Casa da Misericórdia de Alcochete.
Concluindo: sem sinais claros de mudança no estilo de governação, o que o PCP ganhou em 2005 perderá facilmente da próxima vez. Porque quem ganhou as eleições foi o povo soberano!
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