03 março 2009

A fábula

A fábula da globalização também originou em Alcochete um cortejo de vítimas que muitos conhecem: inviabilidade, falência e encerramento de muitas dezenas de pequenas empresas, centenas de aposentados aos 55 anos, crescente emprego precário, insolvência familiar, divórcios em número superior ao de casamentos, droga consumida à vista de todos, mais pobreza e até fome.
Com o foguetório habitual, a retórica do poder semeou ilusões e ergueu inutilidades. Entrementes, nos bastidores foi apadrinhando valiosos negócios imobiliários. Alguns estão descobertos, outros aparecerão qualquer dia. Raros problemas prementes estão solucionados, a maior parte continua oculta e perdura há décadas.
Se e quando houver aeroporto este município até poderá desaparecer, porque há hienas interessadas em ferrar-lhe o dente. Que importa? – dizem alguns. Nada, de facto, enquanto for mero promotor de vaidades, distribuidor de benesses a apaniguados e continuar distante da sua missão constitucional.
Num território cuja fisionomia pouco mudara até à última década do século XX, nos 15 anos seguintes a população quase duplicou. Aliás, não fosse a crise galopante – mais notória desde 2005 – e em vez dos actuais 17.000 habitantes andaríamos agora pelos 25.000. Para os vindouros o PDM de 1996 será a vergonha desta geração.
Quinze anos depois da galinha dos ovos de ouro – tal como dizia uma canção dos «Jáfumega» (anos 80), "a ponte é uma miragem, para a outra margem" – temos diante de nós inúmeros problemas básicos e mais uma crise longa, dura e difícil.
Habitamos um dormitório incaracterístico e descuidado, recheado de carências derivadas de massificação precipitada e desregrada. Receando perder influência, o caciquismo retrógrado ignorou os recém-chegados. Alguns começam a abalar porque as ilusões nunca perduram. Há já centenas de habitações novas e usadas sem mercado, para as quais o aluguer dificilmente será alternativa devido a uma lei estúpida e inútil e a carências de emprego.
E agora, que pensam fazer "iluminados" e vendedores de ilusões? Continuar a emitir licenças para construção de habitação? Insistir na cobrança da taxa máxima de Imposto Municipal sobre Imóveis? Enjaular mais crianças em escolas concebidas há 60 anos? Assistir, passivamente, ao agravamento de problemas sociais?

4 comentários:

Renato P M Ribeiro disse...

Eu espantáva-me com a incapacidade de planear ou prever... face à escola de evidências históricas das redondezas.

Agora a falta de visão da realidade é que sai completamente fora do meu entendimento.

Fora, mas muito fora -em órbita - está o facto de eu não conseguir sequer imaginar as causas de tamanha indiferença política da comunidade. Não há nem oposição, nem situação... não há um pingo de debate de ideias (embora várias já tenham sido expostas em blogues)

Fonseca Bastos disse...

Pura e simplesmente não há comunidade mas um bando de seres humanos isolados e refugiados em casa.
Para existir comunidade teria de haver interacção e solidariedade.

Renato P M Ribeiro disse...

Mas ... nem sequer há grupos de interesses antagónicos?! Ou não há interesses?! Ou tem tudo o mesmo interesse?!
Estamos num deserto? Estamos num "eucaliptal"?

Fonseca Bastos disse...

Não tenho respostas.