Se fosse eu – ou qualquer outro cidadão comum – a falar ou escrever sobre matérias como esta e esta, caía o Carmo e a Trindade. Contudo, são afirmações atribuídas a uma magistrada do Ministério Público, a saber:
"O financiamento das campanhas partidárias é uma 'porta aberta para a instabilidade política', uma vez que os partidos podem tornar-se reféns de quem comparticipa..."
"A corrupção prejudica cada um de nós, enquanto contribuintes" e "cria instabilidade política".
"...os partidos podem ver-se obrigados a dar alguma contrapartida a quem contribuiu com uma certa doação" e o partido pode ficar "dominado por forças invisíveis devido a um financiamento opaco e sem regras".
A magistrada critica ainda o excesso de formalismos e de garantias dos arguidos, que fazem com que os processos demorem anos – em contraponto com sistemas ágeis, como o dos EUA, onde o financeiro Maddof está a ser punido ao fim de poucos meses.
"Estamos a falar de condutas que evoluem num quadro perfeitamente labiríntico, com legislação ultracomplexa criticada pela própria Ordem dos Engenheiros, e que criam filtros sucessivos sobre a verdade e a realidade. O objectivo tem de ser o de combater o negócio sujo do licenciamento urbanístico. Os critérios de aprovação não são objectivos: dá ideia que variam consoante o cliente e que caiem no domínio do cambão. Ou seja, as decisões dos detentores de cargos políticos são inspiradas não pelo interesse público, mas por um grupo particular de interesses. Contudo, não temos maneira nenhuma de punir essas condutas – e essa é outra dificuldade".
Embora a justiça pareça refém do sistema e alguns dos seus agentes reconheçam não terem forma de punir as condutas ilegais, os cidadãos podem penalizar a opacidade na política.
Principiando pelas campanhas eleitorais, podem exigir a divulgação pública da relação de bens e dos interesses patrimoniais de todos os candidatos, de compromissos de honra individuais para o mandato e a publicação em tempo real e a identificação da origem das contribuições para o financiamento da campanha – matérias que aqui abordei, mais de uma vez, nos últimos anos.
Parte da solução era bem simples se os cidadãos ignorassem, desde o início, candidaturas poucos transparentes, em relação às quais é legítimo ter tudo a temer, inclusive escassas garantias de que o mandato se limite a mero e desinteressado serviço cívico prestado à comunidade.
Vivemos há 35 anos em democracia, sabemos ser o pior sistema político à excepção de todos os outros e conhecemos as virtudes e os defeitos do regime que temos.
Está ao seu alcance tentar evitar que políticos pobres quando iniciaram funções ao fim de uns anos estejam milionários, desde que contribua para penalizar, da candidatura ao exercício diário de funções, quaisquer veleidades de acesso a riqueza má feita à conta do erário público.
1 comentário:
Por que razão os candidatos, de uma forma muito peremptória e categórica, não declaram publicamente que querem servir as populações apenas e só a troco do vencimento legal ao fim do mês, que consideram crime a venda de decisões e que recusam determinantemente o aproveitamento do cargo para benesses particulares?
Esta é uma exigência legítima face aos tempos que correm.
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