16 outubro 2006

Pode ser legal mas...


Por estes dias a câmara de Alcochete submete a discussão pública uma proposta de alteração ao Regulamento de Utilização das Instalações Desportivas Municipais, na parte respeitante à piscina.
Um cidadão que pretenda esclarecer-se acerca do alcance da proposta tem de resolver algumas charadas, nomeadamente a existência de versões distintas no sítio da câmara na Internet e no jornal oficial do Estado.
Na redacção original, o Regulamento de Utilização das Instalações Desportivas Municipais, datado de 2003, no art.º 13.º invoca um anexo com as tabelas das taxas cobradas pela utilização das infra-estruturas desportivas. Contudo, tal anexo está omisso na versão electrónica que pode ser consultada aqui.
É esse regulamento que a câmara pretende agora alterar, na parte respeitante à piscina municipal, pedindo a colaboração dos munícipes na apreciação da proposta.
Da informação publicitada pelo município no seu sítio na Internet, num texto do passado dia 11 (entretanto misteriosamente desaparecido), retirei esta hiperligação remetendo para a nova redacção respeitante à piscina (guardei cópia do documento, não vá também desaparecer). Dela nada consta sobre a nova tabela de taxas a cobrar aos utentes da piscina municipal.
No entanto, essa nova tabela existe e fui encontrá-la num edital inserido neste anexo ao «Diário da República» do passado dia 12 (ver pág. 2), no qual nada se menciona acerca do novo articulado respeitante à utilização da piscina, excepto que a "proposta de alteração poderá ser consultada na Divisão Administrativa da Câmara Municipal (...)".
Para mim esta balbúrdia informativa é estranha. Pode ser legal, mas não é correcta e menos ainda transparente.
Em primeiro lugar, o regulamento de 2003 não deveria estar amputado no sítio da câmara na Internet. Em segundo, se se submete uma proposta a discussão pública a versão integral deve constar de todos os meios que a câmara disponibiliza aos munícipes.

Acerca das novas taxas a cobrar na piscina municipal, como não encontrei em parte alguma a tabela em vigor desde 2003 nem há informação acessível sobre a afluência nos últimos anos, por desconhecimento de dados nada posso sugerir.
O derradeiro relatório da actividade camarária é de 2004 e omite a estatística de afluência à piscina. É estranho, mas o facto poderá ser comprovado por quem o guardou.
A meu ver a câmara fará mal em aumentar as taxas de utilização das instalações desportivas se há declínio de utentes. O património desportivo municipal tem uma função social e qualquer aumento de preços tende a coarctar o acesso de cidadãos com baixos rendimentos. Se as despesas crescem e a procura diminui, as acções correctivas deveriam incidir na despesa e não na receita.

Reparei ainda no n.º 5 do art.º 32.º da proposta de alteração ao Regulamento de Utilização das Instalações Desportivas Municipais/Piscina Municipal, cuja redacção é a seguinte: "Os trabalhadores das autarquias e os seus agregados familiares (incluindo apenas o cônjuge e os filhos), reformados e pensionistas com pensões ou reformas inferiores ao salário mínimo nacional, desde que possuidores de cartão de utente, têm um desconto de 50% sobre as taxas aplicadas, mediante apresentação de documentos comprovativos da sua situação".
Parece-me que a benesse proposta para trabalhadores autárquicos e familiares é herança espiritual do corporativismo salazarista, época em que os funcionários públicos eram uns pobres coitados com ordenados miseráveis e sem direitos reconhecidos.
Hoje não vislumbro fundamentação lógica para esses privilégios, excepto a funcionários dos escalões inferiores de remuneração.
Se o desconto apenas é concedido a munícipes cujas pensões de reforma tenham valor inferior ao salário mínimo nacional, haverá sentido de justiça e lógica social ao generalizá-lo a todos os funcionários autárquicos, inclusive dirigentes, técnicos superiores, técnicos, técnicos profissionais e administrativos?
Bem sei que os funcionários autárquicos e familiares têm peso decisivo em eleições locais, mas duvido que sejam parvos e se iludam facilmente.
Para bem deles, nosso e da autarquia, honrar-se-iam melhor compromissos político-eleitorais mandando a caridadezinha às urtigas e investindo em valorização e formação profissional, subsidiando estudos académicos de nível superior, concedendo bolsas de estudo, flexibilizando horários a trabalhadores-estudantes, etc.

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