17 fevereiro 2006

A ponte, o Estado e os nossos direitos


A propósito desta notícia, que evidencia a expansão do conceito "orwelliano" de segurança e informação – matéria aflorada pelo 'comentarista' António num interessante debate que decorre acerca deste texto de João Marafuga – gostaria de partilhar convosco um caso desconcertante, que pode ser facilmente confirmado se nunca repararam nisto.
O mesmo Estado que invoca a segurança e a informação para nos vigiar, presumindo sermos todos mentirosos, relapsos, contumazes e suspeitos, raramente aproveita estas oportunidades legislativas para reconhecer alguns direitos basilares.
Como todos os automobilistas sabem, frequentemente ocorrem acidentes e incidentes na ponte Vasco da Gama. Por vezes mais de duas horas e não raro acima de 60 minutos, centenas de veículos e milhares de pessoas ficam presos nos 13kms do tabuleiro.
É bom recordar que a ponte não funciona desde ontem. Abriu ao tráfego há quase oito anos. Nunca pressenti que o Estado se preocupasse com o elementar direito à informação das vítimas desses imprevistos.
A ponte não é atravessada somente por vacas, porcos, galinhas, bilhas de gás, aço e outras mercadorias. Creio que a maioria do tráfego entre margens continua a ser inerente à mobilidade de seres humanos.
De Sul ou de Norte, à distância suficiente para divergir noutra direcção em caso de bloqueio da ponte, são inexistentes ou nada indicam os painéis avisadores luminosos do IEP.
No sentido Alcochete-ponte, via IC3, nem existe painel algum. Qualquer incauto toma o acesso à ponte e, impossibilitado de retroceder, paga a portagem e vai engrossar a fila.
No sentido Norte-Sul, vindo do túnel do Grilo (CREL), o painel avisador da Lusoponte situa-se em local inapropriado e ninguém com boa visão o lê a mais 300 metros, embora seja impossível tomar qualquer outra direcção, excepto a da congestionada ponte, desde 1.000 metros antes (saídas Sacavém/Aeroporto).
No mínimo, deveria dar-se às vítimas a oportunidade de tomar uma via alternativa, mais rápida, cómoda e segura em situações de ponte bloqueada.
Em meu modesto entender, estas e outras distracções do Estado contradizem as preocupações de segurança e de informação que invoca para nos vigiar, cavando mais fundo o enorme fosso que já o separa dos cidadãos.
Esse divórcio abala a coesão nacional, particularmente em momentos de crise.
Para muitos portugueses o Estado já não é pessoa de bem. Há sinais evidentes de ser sentimento recíproco, porque o Estado tende, crescentemente, a ser policial.
Temo que, qualquer dia, ninguém se lembre que o Estado somos todos nós e que o regime constitucional implantado desde 1976 se baseia na democracia.
Deu-me para reler a Declaração Universal dos Direitos do Homem e fiquei inquieto. Estarão os portugueses a distanciar-se, novamente, dos ideais contidos nos 30 artigos desse documento histórico?

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro amigo,

O comentarista "António" é sem aspas, é António de nome próprio e não se acobert em nicks. Onde serão pertinentes as ditas cujas será em..."comentarista". Vale?
Com amizade, o

António

Fonseca Bastos disse...

E vale mesmo, obrigado.

Unknown disse...

Sr. Bastos, não posso ser indiscreto, mas o António é pessoa fixe. Se ele não reconhecesse valor no que dizemos, jamais daria entrada neste sítio.