13 fevereiro 2006

100 dias: uma mão cheia de nada


Em Alcochete, o executivo municipal da CDU ultrapassou a meta do "estado de graça", o breve período – tendencialmente decisivo – dos primeiros 100 dias de exercício do poder.
A qualidade dos governantes avalia-se pela definição de preocupações prioritárias. Retrospectivamente, creio que o juízo geral acerca dos da CDU será pouco positivo, porque no período mais favorável do mandato só conseguiram prosseguir a construção da biblioteca municipal.
Ainda assim a maioria dos munícipes continua a ignorar que essas obras se reiniciaram a 9 ou 10 de Novembro, presumivelmente em consequência de uma decisão judicial cujo teor se desconhece.
No entanto, pelas implicações da obra no comércio e na vida de centenas de famílias, a inacabada variante foi a pior herança dos antecessores. Mas continua sem fim à vista e ninguém explica porquê nem quando admite poder concluí-la.
O défice de informação tem sido a pecha da nova maioria, representa o seu pior defeito e não tem justificação conhecida.
Sendo a primeira impressão, perigosamente, a que fica na memória dos cidadãos, a única marcante nestes 100 dias parece-me ter sido a insistência no estado das finanças autárquicas. Mas a forma escolhida pode ter um efeito perverso: a acção foi desenvolvida num palco mediático com reduzido impacte na opinião pública e a antiga oposição, que tinha o direito legal de aceder a documentação esclarecedora, não me parece inteiramente alheia ao problema.
Subsiste uma espécie de pacto de silêncio generalizado. Perante os cidadãos ninguém se explica, nem assume ou nega responsabilidades. Daí que, a médio prazo, os eleitores tendam a presumir uma de duas coisas: as dívidas são desculpas ou andam a enganá-los há muito. Qualquer das hipóteses tem péssimas consequências.
A primeira falha desta maioria esteve na metamorfose da candidatura em equipa de governação, que deve ser percebida pelos eleitores pois o que funciona na campanha não ajuda no poder. O longo período de transição de 21 dias (entre 10 e 31 de Outubro) deveria ter sido aproveitado para o explicar. Mas não foi.
Habitualmente definem-se metas de curtíssimo prazo (as que serão realizadas nos primeiros 100 dias), de curto prazo (em seis meses ou um ano), de médio prazo (segundo e terceiro anos) e de longo prazo (quarto ano e no mandato seguinte). Alguém se apercebeu das metas governativas desta maioria?
Deveria ter sido divulgado um plano das prioridades imediatas do novo executivo, porque o seu programa eleitoral não define nenhum em prazo inferior ao primeiro semestre de 2006, à excepção da intenção de auditar o estado da contabilidade municipal.
Em apenas 14 semanas a nova maioria deixou-se enredar na burocracia e na rotina. Foi banal, pouco criativa e previsível. Será difícil adquirir uma imagem positiva tendo-a descurado (senão mesmo abalado) no período decisivo. Os eleitos sentem-se celebridades e caíram na tentação de usar o palco mediático, sem nunca marcarem a agenda política nem acrescentarem nada de inédito. Deveriam ter privilegiado os canais de comunicação directa, mas descuraram-nos.
Não se entende como a "participação da população na vida política activa deve ser efectiva e permanente, e não só durante e antes dos actos eleitorais» – conforme terá dito Luís Franco na cerimónia de posse, citado pelo jornal «Sem Mais» – se o próprio não der, desde o início, sinais claros de querer contribuir para tal.
Continua ausente um dos principais eixos da democracia participativa, com a única excepção das respostas a mensagens pessoais dos munícipes. Essa correspondência é boa fonte de inspiração para projectar ideias, mas a rotina e a burocracia tornam-na inconsequente.
O pior é que, quando a comunicação social encontrar outros protagonistas para fazer manchetes, esta maioria ficará isolada. Principiará então a sua derrocada. As alternativas já se mexem na sombra.

2 comentários:

Anónimo disse...

Enfim...como sempre...nada de novo!
Quanto ao facto de "alternativas já se mexe[em]m na sombra" apetece-me indagar: as sombras serão as mesmas que têm gerado todas as "alternativas" que se têm sucedido? ...
Acendam a luz...uns e outros!

Fonseca Bastos disse...

NIM!!!