Legalmente, estão repartidas pelo Estado, pelas autarquias e pelos cidadãos as responsabilidades da definição do modelo de ordenamento do território, em ordem a assegurar o desenvolvimento económico e social num quadro de sustentabilidade dos ecossistemas. Isto é, cabe a todos a definição de regras e princípios quanto à transformação de solo rural em solo urbano.
Relativamente aos municípios, o principal instrumento orientador da gestão territorial é o Plano Director Municipal (PDM), cuja elaboração é regulada pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro. Complementarmente, existem também os planos de urbanização e os planos de pormenor, que não podem contrariar os princípios daquele.
Parece-me oportuno chamar a sua atenção para o Aviso n.º 5433-J/2007, assinado pelo presidente da Câmara Municipal de Alcochete e publicado na pág. 7836-(56) da edição de ontem do «Diário da República», anunciando o início de um novo período de discussão pública preliminar no âmbito do processo de Revisão do Plano Director Municipal.
De acordo com esse aviso, a "formulação de sugestões bem como a apresentação de informações sobre quaisquer questões que possam ser consideradas no âmbito dos estudos da revisão do Plano Director Municipal de Alcochete poderão ser apresentadas por escrito (por correio ou por mão própria) dirigidas ao presidente da Câmara Municipal de Alcochete", durante 30 dias úteis contados desde ontem (22 de Março).
Julgo que qualquer leitor deste blogue terá opinião formada sobre o modo como tem sido gerido, na última década, o ordenamento do território do concelho de Alcochete. E, pelos resultados visíveis, duvido que a maioria concorde com o PDM em vigor.
Pois bem, chegou a altura de os cidadãos debaterem o assunto e enviarem as suas opiniões à autarquia, devendo divulgar tal correspondência para que haja transparência no processo e se avalie o volume e o tipo de intervenções havidas.
Querem edifícios com mais ou menos de seis pisos? É aceitável construir em altura a menos de 200 metros da beira-rio? Aceitam que novas construções com área superior a 1000m2 e novos loteamentos tenham espaços verdes mínimos, a maioria deles constituída por relvado, arbustos manhosos e árvores que nunca darão sombra? Concordam com a construção de dezenas de vivendas ao lado de outras unifamiliares? As novas urbanizações deverão ou não ter garagens suficientes para parquear um mínimo de dois veículos por habitação? Podem essas garagens ser vendidas ou alugadas e transformar-se em oficinas e armazéns? Pode ser construído um posto de abastecimento de combustíveis em área urbana residencial consolidada? Onde deverão ser construídos novos parques e jardins públicos? E escolas? E o novo cemitério? Que fazer aos terrenos situados junto ao rio? E à praia de Samouco? E ao centro histórico de São Francisco? Deverão terrenos agrícolas transformar-se em urbanizações do dia para a noite? Estarão as principais artérias de escoamento de tráfego dimensionadas para uma população que rapidamente se aproxima dos 20.000 habitantes (o dobro de há 8 anos)?
Importa recordar que nos instrumentos municipais de gestão territorial estão compreendidas definições de matérias tão vastas e relevantes como áreas afectas à segurança e protecção civil, recursos e valores naturais, áreas agrícolas e florestais, estrutura ecológica, protecção do património arquitectónico e arqueológico, redes de acessibilidades, redes de infra-estruturas e equipamentos colectivos, sistema urbano, localização e distribuição das actividades económicas, orla costeira e zonas ribeirinhas, áreas protegidas e outros recursos territoriais relevantes para a conservação da natureza e da biodiversidade.
Ou seja, um PDM mexe com tudo e, portanto, todos têm uma palavra a dizer.
Apelo por isso à participação colectiva e cooperarei, na medida das minhas possibilidades, com quem queira usar este blogue para abordar e debater matérias respeitantes à revisão do PDM.
Espero sugestões e opiniões na caixa de comentários e publicarei todos os textos fundamentados que me sejam enviados (ver contactos na coluna da esquerda), desde que os autores se identifiquem. No entanto, respeitarei os pedidos de anonimato desde que tal seja solicitado.
Pela minha parte, nas próximas semanas darei público testemunho do que penso sobre o assunto.
Entendo deixar já expressas algumas críticas ao presidente da câmara, quanto à metodologia do processo.
Em primeiro lugar, estranho que ainda não considere o correio electrónico como instrumento ideal de comunicação entre os munícipes e a autarquia. Tratando-se de um edil com menos de 35 anos de idade, parece-me absurdo exigir-se correspondência em papel.
Em segundo lugar, devo chamar a atenção para o art.º 5.º do decreto-lei acima mencionado, o qual consagra o direito à informação e cujo ponto 1 está redigido nos seguintes termos: "todos os interessados têm direito a ser informados sobre a elaboração, aprovação, acompanhamento, execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial".
Desconheço ter havido divulgação prévia de qualquer informação esclarecedora da execução e avaliação do actual PDM. Muito menos quanto ao que vai na cabeça dos membros deste executivo (e dos que têm assento na câmara e na assembleia municipal em representação da oposição) acerca da gestão territorial no passado, no presente e no futuro. Tal deveria ter precedido a publicação do aviso acima mencionado, datado de há cinco meses, porque eles têm (ou deveriam ter) o direito legal de acesso a informação que nós desconhecemos!
1 comentário:
Sobre os Indicadores
1. Em 12 de Junho de 2006 foi publicada a lei nº19/2006 que transpõe a Directiva nº2003/4/CE, regulando o acesso à informação sobre ambiente na posse das autoridades públicas, que inclui a administração local.
Esta informação sobre ambiente pode assumir a forma escrita, visual ou sonora electrónica ou outra relativa:
a) Ao estado dos elementos do ambiente como o ar e a atmosfera, a água, o solo, a terra, a paisagem e as áreas de interesse natural, incluindo as zonas húmidas, as zonas litorais e marinhas, a diversidade biológica (…);
b) A factores como as substâncias, a energia, o ruído, as radiações ou os resíduos, incluindo emissões, descargas;
c) Às medidas administrativas designadamente planos e programas;
d) A relatórios sobre implementação da legislação ambiental;
e) À análise de custo-benefício e outras análises e cenários económicos descritos em c)
f) Ao estado de saúde e à segurança das pessoas, incluindo a contaminação da cadeia alimentar.
Para efeitos da divulgação da informação as autoridades públicas recolhem e organizam a informação sobre ambiente na sua posse ou detida em seu nome no âmbito das suas atribuições e asseguram a sua divulgação ao público de forma activa e sistemática através nomeadamente de tecnologias telemáticas ou electrónicas, quando disponíveis.
As autoridades públicas devem assegurar que a informação seja progressivamente disponível em bases de dados electrónicas, e designadamente através da criação de ligações a sítios da Internet.
A informação deve estar actualizada e incluir entre outros: políticas, planos e programas relativos ao ambiente, relatórios sobre a execução dos instrumentos referidos, licenças e autorizações com impacto significativo sobre o ambiente, estudos de impacte ambiental e avaliação do risco relativa ao estado dos elementos do ambiente.
Embora o direito ao acesso à informação sobre ambiente necessite que um requerente, que mesmo sem justificar o seu interesse apresente o seu pedido de informação por escrito do qual constem as os elementos essenciais à sua identificação, é por demais evidente que tratando-se de um interesse difuso sobre dados do ambiente que a todos diz respeito a obrigatoriedade da apresentação de uma declaração de vontade individual com esse propósito não faz qualquer sentido.
2. Com a mesma orientação o PROTAML, publicado através de Resolução do Conselho de Ministros nº 68/2002 de 8 de Abril de 2002, Capítulo 4 – Parâmetros de acompanhamento e avaliação refere que:
Assume particular importância a existência de um conjunto de indicadores ou parâmetros que permitam acompanhar e avaliar a evolução dos fenómenos territoriais e sociais em especial os que se relacionam com as dinâmicas de alteração dos usos dos solos e da sustentabilidade, bem como conhecer os níveis de execução das acções programadas.
Pretende-se que estas informações integrem uma base de dados designadamente para acompanhamento e monitorização da execução dos PDM e do PROTAML.
Em 4.3 é mencionado que o processo de revisão de cada PDM deve iniciar-se por uma acção de avaliação qualitativa e quantitativa do grau e sentido de concretização das propostas nele contidas e dos níveis de execução das acções.
Em 4.4 diz-se ainda que nesta avaliação, assume particular importância o grau de evolução dos principais indicadores urbanísticos e sociais que devem fundamentar e justificar o sentido da revisão.
Em 4.5 descrevem-se os indicadores de sustentabilidade, de controlo dos usos do solo e das utilizações das áreas de construção, indicadores de qualidade e dos indicadores de execução (…)
Em 4.8 menciona-se que nos processos de revisão de cada PDM e os ajustamentos futuros do PROTAML devem incluir na fundamentação das suas opções os valores destes parâmetros.
3. Consta que estes indicadores foram entretanto expressamente pedidos à Câmara pelos dinamizadores do encontro Especial Cidades. Margem Sul: “Perto de Lisboa mas longe do desenvolvimento da capital”, promovido pelo DN em 17 de Janeiro deste ano. E que esta não respondeu nem forneceu qualquer contributo e ficou mal na fotografia. Neste encontro Leonor Gomes da Ordem dos Arquitectos declara mesmo que “a construção está a surgir em série sem preocupações de qualidade arquitectónica e de vida urbana. Serão os novos dormitórios em Alcochete, quando o conceito de habitar deveria ser diferente. Ter marcas de vivência local, caracterizada pela ruralidade, e isso não está a acontecer”.
E mais adiante: “As próprias pessoas refugiam-se na habitação e se puderem, fazem tudo de lá, até compras pela Net. Só que isto é claramente o contrário de uma vida urbana com qualidade. A vida urbana vai muito para além das áreas comerciais. São precisos espaços públicos dignos”.
Quanto aos famosos indicadores fica o mistério de saber onde se encontram por desvendar. Na cabeça dos responsáveis? No canto da gaveta de um qualquer gabinete técnico de estatística? Existem, mas não convém que sejam divulgados porque são uma verdade inconveniente? Ou jamais serão calculados contra o que lei obriga?
Luís Pereira
Enviar um comentário