19 fevereiro 2008

Sugestão sobre alertas de mau tempo

Não tive oportunidade de percorrer o concelho de Alcochete para avaliar a extensão dos danos causados pela chuva intensa da madrugada de segunda-feira (18 de Fevereiro), mas apercebi-me de dois factos: algumas garagens construídas abaixo do solo foram alagadas e estava encerrado ao trânsito um troço da EN118, entre as rotundas do Entroncamento (entrada em Alcochete vindo do IC13) e do pólo logístico do Passil.
Observei também algo ainda mais preocupante: silenciosamente, o pólo logístico do Passil está em ampliação. Não acredite em mim, vá lá ver. Já está pavimentada nova artéria, há nova rotunda meio construída e houve grandes movimentações de terra. Continua a crescer sem que, previamente, seja alargado e melhorado o troço que teve de ser encerrado ao tráfego em consequência da chuva.
Duas ou três coisas me parece oportuno recordar acerca da madrugada de segunda-feira, umas das quais é sugestão para acções imediatas em Alcochete.
Primeira e principal nota: o sistema público de alerta não funcionou. O Instituto de Meteorologia lançou o primeiro aviso de chuva intensa às 22h de domingo, emitindo outros cinco avisos nas seis horas posteriores. A protecção civil entrou em alerta mas, na noite de domingo e na madrugada e princípio da manhã de segunda-feira, a população da Grande Lisboa e arredores desconhecia os riscos a que estava exposta. Até às 02h00 de segunda-feira, pelo menos, os noticiários nada referiram. Nem Rádio, nem TV, nem Internet.
Segunda nota: choveu intensamente, é um facto. Em Lisboa, registaram-se 30 litros por metro quadrado entre as 05h e as 06h da madrugada, sendo de 65 litros/m2 a precipitação acumulada entre as 00h e as 06h de segunda-feira. Se bem me recordo, nas trágicas inundações de 1967 – abordadas num programa pré-gravado e emitido pela RTP1 na noite de domingo – a precipitação acumulada excedeu 100 litros/m2 também em meia dúzia de horas.
Terceira nota e sugestão para futuros alertas em Alcochete: uma vez que quase toda a gente tem hoje um ou mais telefones celulares, o serviço municipal de protecção civil podia e devia organizar uma lista de contactos exclusivamente para fins de alerta por SMS.
Alguns municípios espanhóis, pelo menos, possuem tal serviço e, embora desconhecendo a eficácia prática do processo, presumo que, em casos excepcionais (pelo menos quando haja previsões de chuva forte, embora convenha nunca esquecer o elevado risco sísmico na região), o serviço seria útil a todos, residentes e responsáveis da protecção civil municipal.
A meu ver, a eficácia depende principalmente de dois factores: da confidencialidade garantida aos cidadãos e da credibilidade que o serviço possa merecer.
Antigamente, os sinos das igrejas faziam o mesmo papel. Posteriormente seriam as sirenes dos bombeiros. Mas a dispersão territorial tornou impraticáveis tais métodos de alerta. As mensagens curtas enviadas para telemóveis parecem-me adequada solução a nível local.


P.S. - Breves apontamentos sobre o debate das cheias e das pontes, realizado segunda-feira à noite na RTP1:
a) Há autarcas da margem Sul que pertencem a um velho mundo de verborreia e de vacuidade. Há ainda os "yes men", os que, demonstrando na prática não terem ideias sobre coisa alguma, mascaram a realidade com sinais de assentimento. Acabe-se com eles enquanto é tempo!
b) Parece-me que o ilustre residente Augusto Mateus está mal informado acerca do aumento populacional verificado em Alcochete. Os 2500 novos habitantes por ele invocados verificaram-se em apenas três anos (2004/2006). Se recuar à inauguração da ponte Vasco da Gama (Março de 1998) – a verdadeira causa do caos urbanístico actual – verificará que os dados do INE indicam um aumento de cerca de 6.000 pessoas até 2006.

Passando a coisas muito mais sérias. Não é por coincidirem com o que aqui tenho escrito que devem ser lidos alguns textos seguidamente referenciados. É porque inúmeras vezes escutei avisos ao arq.º Gonçalo Ribeiro Telles, tenho boa memória documental e creio que, sem a adopção de medidas ingentes e urgentes, um dia destes alguns vizinhos alcochetanos também irão por água abaixo. Aqui também há construções em leito de cheio e sobre linhas de água!
Sobre as inundações de segunda-feira em Lisboa:

1. Comentário no «Correio da Manhã»;

2. "A culpa é toda da acção humana. Intempéries sempre houve. A culpa é da total inexistência de planeamento urbano."
– Ribeiro Teles, arquitecto paisagista, "Correio da Manhã", 19 de Fevereiro de 2008;

3. Sobre a especulação imobiliária:
"Não é suficiente salpicar de parques, jardins e arranjos paisagísticos a monstruosa mancha de betão que invade o país"
(Gonçalo Ribeiro Telles, in Prefácio, 'A Arquitectura Paisagista morfologia e complexidade', Manuela Raposo de Magalhães, Lisboa, Estampa, 2001, pág. 20);

4. Cada obra de Ribeiro Telles revela preocupações de equilíbrio entre as necessidades humanas e a Natureza;

5. Cada intervenção sua é uma lição para o futuro;

6. Há muitos anos que ele lança avisos. Como este, este e este, perfeitamente datados.

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