A propósito do encerramento do serviço de urgência do hospital de Montijo – que abrange residentes no concelho de Alcochete – dou público testemunho de experiência pessoal recente.
Segunda-feira, 11 de Setembro, pelas 21h53, acompanhei familiar de 90 anos à urgência geral do Hospital Fernando Fonseca (mais conhecido como Amadora-Sintra). Foi transportada em maca, pelos bombeiros, dado ter ficado, subitamente, paralisada dos membros inferiores. Indiciava problemas vasculares, queixando-se de dores numa das pernas.
O registo de entrada e a triagem demoraram 15 minutos, se tanto. Na triagem foi-lhe atribuído o código laranja, o mais alto na escala de prioridades de atendimento.
Após a triagem foi conduzida ao corredor de atendimento da urgência e aí ficou à espera. Nenhum médico, enfermeiro ou auxiliar se abeirou dessa e de outras macas que ali permaneciam, indagando dos motivos do recurso aos serviços, dos sintomas, das carências alimentares e de apoio para satisfazer necessidades fisiológicas.
Cerca da 01h00, o familiar solicitou informação sobre a hora previsível do atendimento. Não foi possível sabê-lo mas informaram-no haver ainda, à frente, cinco doentes com o mesmo grau de prioridade.
Como a espera continuasse até às 02h30, renova-se então o pedido de informação sobre quantos doentes havia ainda à frente. Os mesmos cinco!
Pede-se o livro de reclamações e elabora-se o respectivo protesto, conforme mandam as regras, por se tratar de doente idosa, hipertensa e diabética. Essas duas maleitas foram indicadas na triagem, tal como o problema nos membros inferiores.
O atendimento médico verificar-se-ia quase seis horas após a admissão, cerca das 04h30 da madrugada. A administração de dois comprimidos e de soro foi tudo o que se conseguiu apurar. Não houve exames complementares.
Até ao momento, o familiar que acompanhava a doente desconhece o diagnóstico.
A doente teve alta por volta das 08h00 de terça-feira, 12 de Setembro. Continuava paralisada dos membros inferiores e foi acolhida na residência de familiares, em Alcochete.
Como os sintomas se mantivessem, dois dias depois os familiares recorrem à urgência do hospital de Montijo. Após exames complementares é-lhe detectada isquémia na perna direita (bloqueio de artérias) e rapidamente transferida para uma unidade hospitalar de Lisboa. Aí continua internada, até à data, com prognóstico reservado.
Em conclusão: após quase seis horas de espera, num corredor, médica da urgência geral de um hospital muito movimentado não desconfia de isquémia ao observar os membros inferiores de uma paciente.
Dois dias depois, médicos da urgência de um hospital pequeno à beira de encerrar pedem exames complementares, detectam a isquémia e, de imediato, transferem a doente para uma unidade especializada. Medearam três horas entre a entrada no hospital de Montijo e a admissão no da capital.
Estes são os serviços de saúde que temos: por razões economicistas subsistem os péssimos, acabam os eficientes.
Lutei por um país e um Estado muito diferentes. Hoje não tenho meios para continuar essa luta.
Agora é convosco.
2 comentários:
Lamento mas não partilho de alguns receios relativamente ao encerramento de certos serviços “locais” por muito polémica que seja a minha opinião.
Desde há muito que ajudo a salvar a vida e protejo a saúde dos meus familiares recorrendo a hospitais localizados na área de Lisboa onde presumo existirem equipamentos modernos e médicos competentes e especializados.
Em situações de grande urgência transportei-os para hospitais HCL e não só: S. José , S.Maria, SAMS e não me arrependo porque quanto aos resultados considero-os suficientes ou bons.
Detestei ver como se aproximava a morte de um homem que ficou retido durante duas horas no Hospital do Montijo sofrendo de fractura craniana enquanto os decisores hesitavam em o transferir para o Barreiro por défice de recursos próprios no Montijo. Desconheço se chegou ao destino com vida.
Um tio querido padecendo de ataque cardíaco já na fase terminal da vida esgotou os últimos minutos da existência em trânsito deste hospital para aquele, conduzido pelos bombeiros neste labirinto burocrático, qual ratoeira sem apelo em que se transformou a assistência hospitalar neste distrito, numa ocasião em que estando no gozo de férias não pude valer-lhe.
Uma excelente infraestrutura viária constitui um factor determinante para que se encontrem as melhores soluções em situações em que todo o minuto conta.
Não privilegio este hospital em detrimento de outro. Havendo liberdade de escolha cada um deve em consciência fazer as suas opções.
O ideal seria que que o direito à saúde se materializasse numa prestação social efectiva de qualidade tendo o Estado como parceiro.
Luis Pereira
Meus Senhores,
Acho que os problemas burocráticos e de negligência acontecem em todos os hospitais e clínicas privadas.
Mas, e há sempre um mas em tudo, continuo a achar que as urgências do Montijo vão fazer falta.
Infelizmente já passei algumas noites nas urgências do Montijo e vi de tudo em termos de acidentes, doenças,mal-estares.
E se algumas das situações que vão para o Montijo passarem a ir para o Barreiro vamos ter grandes problemas neste Hospital e principalmente de qualidade, pois não acredito que o fechar das Urgências no Montijo vá levar a que o Ministério coloque mais médicos e enfermeiros no Barreiro...
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