04 setembro 2008

Números não mentem

Retomo um debate que pode andar perdido nos comentários e me parece valer a pena trazer a primeiro plano.
A derrama de 1,5% lançada pelo município de Alcochete sobre a colecta de IRC das empresas afigura-se-me financeiramente secundária: a previsão dessa receita, incluída no orçamento municipal do ano corrente, é de 330.163€, valor equivalente a, por exemplo, 62% do custo estimado da construção da zona desportiva do Valbom.
Tão pouco que talvez seja mais útil estimular os empresários a aplicar o valor da derrama em projectos locais de índole social, dando público testemunho do apreço por tais acções.
Geralmente as receitas da derrama são baixas. Prova-o o facto de, entre 308 municípios, o de Alcochete ser um dos 159 que a lançam. Sobram 149 que terão concluído ser irrelevante esse contributo directo das empresas para as receitas municipais, embora o seu papel no desenvolvimento local seja imenso se existirem adequadas estratégias de atracção de investimento.
Daí que, obviamente, todos os municípios tenham políticas activas de captação de sectores produtivos. Basta percorrer o país e manter os olhos abertos. Bem perto há visíveis casos de sucesso.
A existência de derrama em Alcochete parece-me inconveniente porque a esmagadora maioria dos residentes activos trabalha longe, os custos das deslocações são elevados e, por muitas outras razões conhecidas, deveria ter oportunidades tão perto quanto possível.
Já aqui defendi duas ideias que mantenho:
a) Empresas que instalem sedes sociais na área do concelho deveriam beneficiar de isenção de derrama sobre a colecta de IRC por um período de 10 anos;
b) O município assume como uma das suas principais prioridades o emprego de residentes perto do lar e, dentro dos limites legais, concederá benefícios específicos às empresas que criem sedes, instalações produtivas ou industriais não poluentes e um número significativo de postos de trabalho em que seja dada preferência a residentes.
Visivelmente, na última década não houve empenho suficiente nesta matéria. Há piedosas promessas eleitorais, mas tudo ficou no papel. Estatísticas oficiais de 2006 indicam que, para uma população activa de 9036 indivíduos, as empresas locais empregavam pouco mais de 1/3: 3454 trabalhadores.
Espalhando betão a eito, o desenvolvimento baseou-se sobretudo em construção habitacional. Seguindo uma das hiperligações fornecidas acima, qualquer cidadão curioso descobrirá que, actualmente, nos impostos directos as receitas municipais mais significativas provêm do imposto municipal sobre a transmissão onerosa de imóveis (2.394.015€), do imposto municipal sobre imóveis (1.982.961€) e de loteamentos e obras (1.084.610€).
Os números demonstram por que, em menos de uma década, se converteram Alcochete, Samouco e São Francisco em dormitórios de "refugiados", desenraizados e desinteressados: estes três impostos representam hoje cerca de 1/3 das receitas do município.


P.S. - Contrariamente ao que era minha intenção inicial, por falta de dados estatísticos comparáveis não é possível prosseguir o artigo.

Sem comentários: