Se o estimado concidadão bem se lembra, há dois meses – aquando do anúncio da decisão preliminar de construção do aeroporto a 22kms de Alcochete – TV, Rádio e Imprensa andaram por aí, registando duas conclusões supostamente autênticas: o valor dos terrenos subira da noite para o dia e apareciam muito mais interessados em comprar casa no concelho.
Também estudei marketing e sei como se criam necessidades aos consumidores. Mas os jornalistas têm o dever profissional de discernir entre a realidade e a ficção para serem credíveis perante os seus leitores, ouvintes e telespectadores. Não o notei então e isso surpreendeu-me.
Agora que a poeira começa a assentar surge esta notícia, para ler de princípio a fim. Não é de espantar e confirma o óbvio: se o aeroporto não era ainda um dado adquirido e se se perfila como projecto para uma década, o foguetório antecipado era ilógico.
Mesmo a especulação com terrenos não faz sentido – a menos que alguém tivesse informação privilegiada que a maioria ainda desconhece – dado que o Estado terá de defender o projecto em Bruxelas demonstrando a sua sustentabilidade ambiental.
Tal implica a imposição de condicionamentos urbanísticos e limitações à reconversão do uso de solos, numa área que o próprio estudo do LNEC aponta para 20 a 25kms – nela se incluindo, pelo menos, toda a freguesia de Alcochete – o que deverá saber-se, presumivelmente, ainda este mês.
É patente que, muito antes da hipótese aeroporto, a redução de negócios no mercado da habitação atingira Alcochete em cheio. Basta andar por aí e reparar serem inúmeros os edifícios de alojamento colectivo onde existe, pelo menos, um andar usado à venda.
A lentidão da construção da maioria dos novos projectos imobiliários é outro indicador seguro da crise, que arrasta empresas débeis para a falência e as maiores para a estagnação.
Há outras realidades nada animadoras: o desemprego mantém-se em níveis elevados, o trabalho precário aumenta, o crédito à habitação nunca foi tão restringido, os impostos e os preços sobem diariamente.
Num suplemento da edição de ontem (8 de Março) do semanário «Expresso», o presidente da associação de empresas de mediação imobiliária põe, mais uma vez, o dedo na ferida: os impostos sobre a transacção onerosa de imóveis (IMT) e municipal sobre imóveis (IMI) têm taxas absurdas. Constituem receitas próprias dos municípios, subiram vertiginosamente em cinco anos e, pelo menos o IMI, a partir de 2010 aumentará ainda mais.
No caso concreto do Município de Alcochete, as receitas de IMI mais que duplicaram entre 2000 e 2005 e as de IMT aumentaram mais de 25%.
Fácil é depreender que algumas soluções dependem da responsabilidade social dos autarcas, que dispõem de autonomia para reduzir despesas supérfluas, baixar alguns impostos e limitar a expansão urbanística para evitar males maiores.
Não reagir já à crise é um erro de consequências previsíveis, que arrastará na onda proprietários, empresários e autarquias.
Os cidadãos terão de pressionar os autarcas a encontrar soluções rápidas e eficazes. A cooperação dos jornalistas seria extremamente importante, porque notícia não é só o que levanta poeira. Há fogo brando latente na sociedade e ignorá-lo seria prestar um mau serviço.
P.S. - Alguém chama a minha atenção para uma outra realidade preocupante: a quantidade de proprietários que alegam a impossibilidade de pagar atempadamente a sua quota-parte nas despesas dos condomínios. Segundo esse alguém, o volume de dívidas começa a deixar alguns administradores à beira de um ataque de nervos.
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