16 outubro 2007

A caminho dos 100 dólares

Ontem, os media da televisão por cabo brindaram os telespectadores com três programas sugestivos:
- Um documentário no canal Odisseia sobre “O fim do petróleo”. Uma retrospectiva da crise energética norte americana na sequência da catástrofe provocada pelo furacão Júlia.
- Uma entrevista na RTPN com responsáveis da Galp e do sector energético nacional entre os quais se contava o Engº Mira Amaral, ex-ministro da indústria e energia.
Este proferiu então uma declaração lapidar e peremptória: “Os dias do petróleo barato já terminaram”.
- Um programa na BBC World versou o mesmo tema do petróleo.
Na manhã de hoje recebi a notícia de que o preço do barril de crude atingiu novo máximo histórico acima dos 85 dólares
A Agência Internacional de Energia estima que a taxa de depleção do ouro negro é de 4% ao ano. Por agora o mundo produz aproximadamente 86 milhões de barris por dia.
Isso significa que o planeta necessita de adicionar diariamente mais de três milhões de barris por dia à capacidade de produção existente.
De acordo com o relatório da AIE a procura de crude crescerá 2,4% no próximo ano o que significa que teremos de adicionar outros 2 milhões de barris à produção global do mercado.
Um comentador da AIE, diz que este deficit representa o equivalente a descobrir uma nova Arábia Saudita em cada dois anos. Mas como nada disto irá acontecer, caro leitor, no horizonte já se divisa o preço de 100 dólares, como aliás foi vaticinado ontem por um dos entrevistados na RTPN.
No último mês os preços nos EUA mantiveram-se estranhamente elevados. Normalmente na sequência do Verão nesse país, com a redução de tráfego nas estradas os preços descem devido à menor procura. Segundo consta chegou até a haver previsões de descida para 60 dólares em certos relatórios optimistas.
Contudo, este ano as coisas não se passaram como é normal. Os preços sobem copiosamente precisamente na época em que deviam tipicamente descer devido à menor procura. Devemos então surpreender-nos com o rumo que as coisas estão a tomar?
A resposta dos peritos na matéria é NÃO.
A OPEC anunciou que a produção aumentaria 500000 barris por dia, a começar em 1 de Novembro. Nestas condições os preços deveriam começar a descer e os clientes petróleo dependentes ficariam mais tranquilos. Infelizmente, outros comentadores dizem que estas medidas só afectarão ligeiramente os preços. Também surgem nos ministros do Qatar declarações contraditórias sobre os preços a praticar : 100 ou 80 dólares o barril.
Existe uma outra razão para a subida dos preços. Há menos petróleo disponível para a exportação nos países produtores .
Não significa isso que a bombagem diminua ou que não se encontre fluido no subsolo. Ainda existe uma quantidade imensa por explorar. O problema é que os níveis de consumo crescente dos países exportadores provocam menos disponibilidades para a venda aos países receptores.
Tomemos como exemplo o caso de alguns dos maiores países exportadores.
O consumo doméstico da Arábia Saudita cresceu 6,2% para 2 milhões de barris por ano.

O Irão também experimenta problemas semelhantes. O anterior ministro do petróleo foi despedido pelo Presidente Ahmadinejad após qualificar o consumo de energia como prejudicial para o país. Já não se trata de saber se o petróleo atingirá a fasquia dos 100 dólares mas quando tal irá suceder.

4 comentários:

Unknown disse...

Se este quadro não se inflectir, que irá acontecer à Europa?

Luis Pereira disse...

Meu caro fiquei impressionado com o que vi no canal Odisseia. Infelizmente, a crise é global e não apenas europeia. Os indícios já se divisam nos países mais pobres, naqueles que dispõem de menos poder aquisitivo.

Fonseca Bastos disse...

Há decisões individuais que podem atenuar os efeitos negativos conhecidos.
Uma delas consta de um texto que inseri há meses no blogue:

http://praiadosmoinhos.blogspot.com/2006/09/quer-partilhar-o-seu-carro.html

Luis Pereira disse...

Consta que nos meios científicos e em geral entre os defensores das energias renováveis a situação estava a deteriorar-se progressivamente e a consolidar-se a ideia de que a estagnação ou a queda dos preços do crude no curtíssimo prazo só contribuiria para o aumento da ansiedade reinante. Ninguém tinha o poder de convencer a OPEC a colocar mais crude no mercado mundial e por conseguinte os preços fatalmente teriam de subir. Já no fim de Agosto se previa que os meses subsequentes tenderiam a ser decisivos..
No passado os preços do barril de petróleo caíam à medida que o Inverno se aproximava. Em Janeiro os preços voltavam a cair nos EUA para um valor um pouco acima de 40 dólares. Contudo, alguns dos relatórios elaborados já apontavam para uma subida até aos 95 dólares antes do fim deste ano.
Os peritos estão a testar nos anos 2007 e 2008 a teoria do pico global de produção do petróleo. Um estudo de Hubbard segundo o qual a produção global de petróleo atinge o seu valor máximo no ano corrente, tendo como corolário lógico que neste ponto as reservas existentes são iguais às reservas ainda inexploradas. Em suma a procura do ouro negro está a atingir níveis que a produção global não pode comportar.
A produção de petróleo já não consegue satisfazer as necessidades mundiais.
Por exemplo a China há um mês importou aproximadamente 40% mais petróleo do que no último ano. Foi descoberta uma nova reserva petrolífera cuja dimensão acaba por ser inferior à inicialmente estimada e que efectivamente se revela insuficiente para satisfazer a sede do país.
A Arábia Saudita parece incapaz de aumentar a produção. Após a bombagem de água realizada nos últimos anos a sua maior região petrolífera é actualmente mais um aquário do que uma reserva petrolífera.
Finalmente, de acordo com outros estudos já publicados há anos o pico de produção do petróleo coloca aos actores envolvidos um desafio sem precedentes, um problema de gestão do risco do negócio do petróleo à escala mundial. Quanto maior for o compasso de espera mais difícil será gerir os seus efeitos.
Em 2050 o planeta será habitado por mais de nove mil e meio milhões de pessoas. Imaginem a quantidade energia que será consumida quando se vislumbra que países como a China e a Índia não se revelam capazes de abrandar o seu crescimento económico. Um dos piores sinais que podiam acontecer neste inverno era haver uma descida dos preços do barril transmitindo a sensação errónea de tudo estava no melhor dos mundos. Além disso, a descida dos preços parece ter as seguintes desvantagens:
- A estagnação dos preços não contribui para o lançamento de novas explorações petrolíferas e restringe o seu desenvolvimento;
- O desenvolvimento de novos projectos de energias renováveis e alternativas seria adiado;
- Haveria menos recursos para financiar o desenvolvimento de outras fontes energéticas de petróleo não convencionais.