É sabido que sempre me insurgi contra as listas de independentes às autarquias. Mas será que sobre esta matéria alguma vez tivesse dado uma justificação convincente? Proponho-me a fazê-lo desta feita.
Se eu sou um defensor da democracia representativa e se sou coerente com essa defesa, jamais poderei embarcar na historieta dos independentes.
Sempre que reflicto sobre os independentes, vem-me à cabeça a experiência antiga da democracia directa. Se esta não serve para o Estado por ser gérmen de desordem, como é certo que sirva para as autarquias?
Os independentes, cuja ambição de poder não tem limites, vêm alterar a ordem das grandes facções políticas da sociedade, quero dizer, os partidos. Não obstante tudo, é com estes que eu conto a fim de que os portugueses reencontrem o rumo ao lado dos povos mais prósperos do mundo.
8 comentários:
Mesmo à luz dos ensinamentos da História discordo da sua tese.
Ao longo da vida, dentro e fora dos partidos encontrei do melhor e do pior na raça humana.
Garanto-lhe que a ambição ilimitada do poder não é exclusiva dos independentes.
Serão os independentes um perigo público quando estiveram em clara maioria nas listas às eleições locais de 2005 em Alcochete?
As candidaturas de Helena Roseta e Carmona Rodrigues nas eleições intercalares em Lisboa e a memória recente de alguns candidatos vitoriosos apoiados por “grupos de cidadãos eleitores” nas autárquicas de 2005 chamam de novo a atenção para o papel dos “independentes” nas eleições locais. Quando se alterou a Constituição em 1997 para permitir estas candidaturas, falou-se muito sobre a forma como assim se poderia impulsionar a “participação da sociedade civil” na política local, aumentar e diversificar as opções políticas ao dispor dos eleitores e aumentar o envolvimento político dos cidadãos. Dez anos depois, passadas duas eleições autárquicas (2001 e 2005), vale a pena fazer um balanço. Reconheço desde já que é um balanço generalista e superficial, negligenciando muitas das circunstâncias concretas e especificidades de cada concelho. Mas talvez chegue para termos uma primeira ideia sobre até que ponto se concretizaram as expectativas iniciais mais benignas sobre esta inovação institucional.
Um observador desprevenido poderia ser facilmente desculpado por concluir que as candidaturas “independentes” e “emanadas da sociedade civil” têm sido um enorme sucesso. Afinal, de 2001 para 2005, o número de concelhos onde concorreram listas apoiadas por “grupos de cidadãos eleitores” às câmaras municipais aumentou de 21 para 27, ou seja, chega já a quase nove por cento do total de concelhos. O número de presidências de câmara conquistadas por candidatos “independentes” mais do que duplicou de 2001 para 2005, e quase dois terços destas candidaturas conseguiram eleger vereadores nas últimas autárquicas. Pode parecer pouco, especialmente em comparação com o que passa em países como a Suécia ou a Noruega, onde há candidaturas “não-partidárias” em mais de um terço dos municípios. Contudo, é bastante em face da total novidade da experiência em Portugal, e sobretudo em comparação com muitos países europeus onde esta possibilidade existe há muito mais tempo.
Sucede que um olhar mais aprofundado revela outros aspectos que passariam despercebidos se nos ficássemos pela análise anterior. Em primeiro lugar, importa notar a quase total ausência de continuidade destes “movimentos de cidadãos” de 2001 para 2005. As três únicas excepções são Alcanena, Penedono e Vouzela. Contudo, em Alcanena, trata-se do “movimento” que apoiou a candidatura em 2001 e 2005 daquele que já era anteriormente o Presidente da Câmara, eleito pelo PS. Em Penedono e em Vouzela, as candidaturas “independentes” são, de facto, listas “apadrinhadas” por partidos políticos. Assim, nuns casos, fracassado o seu propósito meramente instrumental – a eleição de vereadores ou deputados municipais - estes “movimentos” eclipsaram-se depois de 2001, tendo muitos dos seus candidatos feito posteriormente pela vida em listas partidárias. Noutros, foi o sucesso desse objectivo instrumental que permitiu o regresso da hegemonia partidária em 2005. Em Ponte de Lima, aquele que já tinha chegado a Presidente de Câmara numa lista partidária ganhou em 2001 como “independente”, voltando a ganhar em 2005, de novo, numa lista do mesmo partido. Em Penamacôr, o ex-líder da concelhia do PS ganhou como independente em 2001, voltando a ganhar em 2005 mas, desta vez, à frente de uma lista do PSD.
A suposta “vitalidade” da sociedade civil que estas candidaturas supostamente indicariam é ainda mais colocada em causa quando examinamos a sua origem em cada uma das eleições, particularmente das mais bem sucedidas. Em 2001, as três câmaras conquistadas por candidatos “independentes” foram-no pelos presidentes de câmara em funções. Em 2007, cinco das sete vitórias das candidaturas “independentes” - Alcanena, Felgueiras, Oeiras, Gondomar e Redondo - correspondem ao mesmo modelo, com Alvito e Sabrosa a serem as únicas excepções a este padrão. E a esmagadora maioria das listas “independentes” que elegeram vereadores em 2005 foram apadrinhadas por partidos, por facções das concelhias partidárias em conflito com as distritais, ou por facções das distritais em conflito com os órgãos nacionais dos partidos. O mesmo, de resto, já tinha sucedido em 2001.
E até que ponto a presença destas listas aumenta a diversidade das opções políticas ao dispor dos eleitores, a representação de interesses antes negligenciados e o envolvimento dos cidadãos na vida política local? Em rigor, não sabemos. Mas podemos recorrer a uma indicador indirecto: a participação eleitoral. Em 2005, a taxa média de participação nos concelhos que tiveram pela primeira vez candidaturas independentes foi de 67,2 por cento, acima da média nacional de 61 por cento. Contudo, em 2001, nos mesmos concelhos e sem independentes, já tinha sido de 65 por cento, também acima da média nacional de 60,1 por cento. Por outras palavras, não há qualquer indicação de que a presença de listas “independentes” tenha aumentado o envolvimento político ou a percepção de mais, melhores e mais mobilizadoras alternativas por parte das populações.
Irrelevante, então, esta inovação institucional? Nem pensar. Nuns casos, ela vem clarificar situações onde a implantação de um determinado partido sempre esteve dependente do poder de um determinado candidato, dos interesses que agrega e da sua rede de influências, revelando o carácter descartável dos partidos em muitos municípios de pequena dimensão. Noutros, vem aumentar o “potencial de chantagem” que as estruturas locais têm em relação às lideranças partidárias nacionais, reforçando aquilo que o politólogo Peter Mair já anunciava como o futuro do chamado “partido-cartel”: a “estratarquia”, um sistema em que cada “estrato” do partido é independente dos restantes, deixando a cada um deles as mãos livres para gerir a distribuição de lugares políticos no nível respectivo, exigindo apenas a conciliação de interesses quando se trata de atribuir lugares elegíveis no parlamento. É uma transformação fascinante. Contudo, na esmagadora maioria dos casos, não parece que, até agora, tenha tido alguma coisa a ver com a “sociedade civil”, o “poder dos cidadãos” ou qualquer amável cliché do mesmo género.
Luis Proença
Qualquer lista às eleições locais apadrinhada por partidos políticos ou organizada apressadamente, em função de jogos de poder e de interesses de antigos e actuais autarcas, ou ex-militantes de partidos, será tudo menos representativa da chamada "sociedade civil".
Os casos de Carmona Rodrigues e Helena Roseta são disso um bom exemplo, tal como os de Felgueiras, Oeiras e outros referidos por Luís Proença.
E ainda bem que aludiu a exemplos das democracias escandinavas, porque na Europa do Norte essa experiência produziu muitos e bons resultados e há lições a extrair.
Para conseguir mobilizar e arvorar-se representativo da sociedade civil, qualquer grupo de cidadãos terá de surgir e começar a trabalhar anos antes dos períodos eleitorais, organizar-se com objectivos singelos e o seu núcleo fundador demonstrar boa-fé e coesão.
Em sociedades abúlicas, apáticas e desinteressadas, nunca será num ano ou seis meses que se adquirirá representatividade suficiente. É imprescindível um longo trabalho de diálogo e de esclarecimento.
Não é fácil chegar perto das pessoas e despertá-las para a realidade que as rodeia, mormente quando pouco ou nada sabem acerca do que está para além da porta de casa.
E, retomando o que escrevi no meu comentário anterior, a propósito do texto do professor Marafuga, se um tal grupo dinamizador tiver objectivos muito claros e, desde início, se mostrar aberto à participação do maior número possível de cidadãos, não vislumbro qualquer risco para a democracia representativa se, mais tarde, no seu seio surgir uma lista concorrente a eleições locais.
Para não ferir demasiado as susceptibilidades e demonstrar a qualidade e a valia da equipa, recomendaria começar por concorrer a juntas de freguesia.
Ponto 1: Existe em Portugal uma opinião negativa, pública e generalizada, relativamente à política, nacional e local e em relação aos seus agentes;
Ponto 2: Não é seguro dissertar sobre a justeza de tal opinião, sob pena de entrarmos em campos como o de determinar o que veio primeiro: o ovo ou a galinha;
Ponto 3: A esgamadora maioria dos movimentos de cidadãos do nosso país realizam-se contra os partidos, não sendo, por isso, representativos de uma cristalina vontade popular;
Ponto 4: Assim que chegarem ao poder, esses movimentos perderão imediatamente o benefício da dúvida da população, pelo simples motivo que foram eleitos pelas razões erradas: eles querendo revanches partidárias; o povo querendo alternativas para o que julga que é preciso alternativa;
Ponto 5: Se um grupo de cidadãos formasse um partido, em vez de criar um "movimento", seria culpado que quê?
Ponto 6: Se um político derrotado afirma que a abstenção é um voto de protesto no vencedor não deveria ele próprio não votar, em vez de se candidatar?
Ponto 7: Um político só merecerá o respeito da população quando se der ao respeito. E dar-se ao respeito implica dizer à população coisas que a população não quer ouvir.
Ponto 8: Se um dirigente partidário, em directo na RTP em entrevista a Judite de Sousa, tenta justificar Hugo Chávez pelo fecho de um canal independente de televisão e ninguém no país se manifesta, o que fazer?
Desta interessante troca de ideias , e sem prejuízo da validade do que se possa afirmar sobre a verdadeira natureza e importância das candidaturas ditas independentes , há um ponto que nitidamente se destaca e que me parece ser partilhado por qualquer dos intervenientes.O que se impõe é que apareçam políticos que façam Política, que se acerquem dos cidadãos e que com eles resolvam os seus problemas em vez de esbanjarem os dinheiros públicos em campanhas eleitorais de propaganda enganosa e de circunstância , cujo único objectivo é o show mediático!
Precisamos , como de pão para o boca, de gente séria na política, gente genuinamente interessada em chamar os cidadãos a uma participação activa na resolução dos problemas , fim primordial para o qual devem querer ser eleitos.
Luis Proença
Impõe-se que cidadãos atentos e com experiência de vida ponham a mão na política e contribuam para a regeneração do sistema, devolvendo dignidade ao poder local.
Se o dinheiro que entra nos cofres das autarquias resulta de taxas e impostos directa ou indirectamente cobrados aos contribuintes, é admissível que não se apresentem contas nem justificações acerca do que foi feito com o que a maioria paga com tanto sacrifício?
Alguém tolera que meios de comunicação de uma autarquia, pagos com o dinheiro de todos, sirvam de palco para cortejo de vaidades, de exibicionismo e de promoção pessoal de alguns dos seus membros e apaniguados?
É admissível que autarcas boicotem e tornem inviáveis iniciativas da sociedade civil, só por não deterem o controlo maioritário dos processos de decisão?
Precisamos, muitíssimo, de gente pro-activa na política, disposta a pugnar pelos verdadeiros interesses da comunidade, inquestionavelmente interessada em informar e esclarecer os cidadãos para os envolver nos principais processos de decisão.
Um simples exemplo local: votar nos partidos da oposição, em Alcochete, no ano de 2005, serviu até hoje para quê?
Dou outro exemplo local, bem mais confrangedor: votar no partido vencedor em 2005 serviu até hoje para quê?
O problema não são os partidos políticos, mas sim o Homem. Afinal, quem é que dá vida aos partidos? O Homem, pois claro. Um partido não tem identidade nem autonomia próprias, reflecte apenas o carácter e a inteligência das entidades humanas que o compõem.
Os partidos não são corruptos, os seus membros é que o podem ser.
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