23 maio 2012

VIAGENS NA MINHA TERRA de Almeida Garrett

Acabei de reler Viagens na Minha Terra de Almeida Garrett (1799-1854) e pensei que devia partilhar com os visitantes deste blog a "viagem" que faço às Viagens...
Embora todos saibamos que Garrett lutou pelos liberais de armas na mão, a verdade é que bem se nota no curso do discurso a nostalgia do antigo regime...sobretudo através da personagem Frei Dinis: «segundo os seus princípios, poder de homem sobre homem era usurpação sempre e de qualquer modo que fosse constituído. Todo o poder estava em Deus que o delegava ao pai sobre o filho, daí ao chefe da família sobre a família, daí a um desses sobre todo o Estado, mas para o reger segundo o Evangelho e em toda a austeridade republicana dos primitivos princípios cristãos» (Círculo de Leitores, Lisboa, 1978, p. 69). Ora esta estrutura de pensamento é a velha ordem, sem que, obviamente, aqui, o adjectivo "velha" tenha significado negativo.
Correspondendo aos Costas, Limas, Isaltinos...de hoje, os barões agiotas são execrados em Viagens na Minha Terra até à exaustão. Escreve Garrett: «mal do governo que deixar comer mais aos barões» (ibidem, p. 179). E um pouco mais à frente: «mais dez anos de barões e de regime da matéria, e infalivelmente nos foge deste corpo agonizante de Portugal o derradeiro suspiro do espírito» (ibidem, p. 186).
O que Garrett exalta recorrentemente é o povo: «...porque o povo, o povo está são. Os corruptos somos nós, os que cuidamos saber e ignoramos tudo» (ibidem, p.186).
Ora é aqui que me surge uma dificuldade que expresso pelas seguintes perguntas: o que entende Garrett por povo? O povo vassalo ou aquele que livre trabalha para ganhar com a satisfação das necessidades dos outros? Em toda a obra em foco, eu não vejo o espírito que preside a esta segunda hipótese, tendo eu a certeza de que tal espírito vou encontrá-lo em Cesário Verde. Mas este segundo Camões da nossa Literatura fica para um próximo texto que deixarei aqui se Deus quiser.

Nota: eu estou livre de todo esse discurso académico que face a Almeida Garrett recorre ao Romantismo para desbocar frases feitas. Para mim, antes do Sturm und Drang está o homem.




1 comentário:

Unknown disse...

Quando eu falo no povo «...que livre trabalha para ganhar com a satisfação das necessidades dos outros», estou a falar do capitalismo normal. Os «barões» do tempo de A. Garrett ou os Costas, os Limas, os Isaltinos, etc., de hoje são os parasitas do capitalismo.
São os Costas, os Limas, os Isaltinos, etc., que mancomunados com o Estado e este com eles fizeram a crise que nos vai dando a morte lenta.
Também é preciso tomar consciência de que no Romantismo, já portanto em A. Garrett, muito especialmente em VIAGENS NA MINHA TERRA, assistimos ao estado nascente da religião biónica, isto é, do culto da natureza, também dito ecologismo ou ambientalismo. SOU RESPONSÁVEL POR TODAS AS AFIRMAÇÕES QUE AQUI FAÇO.