Recentemente,
o Governo aprovou o processo de privatização da Empresa Geral do
Fomento (EGF), a qual é responsável por assegurar o tratamento e
valorização dos resíduos sólidos urbanos, de forma ambientalmente
correcta e economicamente sustentável, contribuindo para a melhoria da
qualidade de vida e do meio ambiente.
AEGF tem por missão
responder pela gestão dos sistemas criados, cujas 11 empresas
concessionárias, constituídas por ela em parceria com as autarquias,
processam anualmente quase 4 milhões de toneladas de resíduos sólidos
urbanos (RSU), produzidos em 174 municípios por cerca de 60% da
população de Portugal.
Na península de Setúbal, a EGF, em
associação com 9 municípios, criou a Amarsul que serve 780 mil
habitantes distribuídos por uma área geográfica com cerca de 1.500 km”.
Em Alcochete, a Câmara Municipal (CMA) detém uma pequena participação
do capital social da Amarsul, estando todo o território do concelho
coberto no tocante à recolha e tratamento dos RSU que produz.
Ora, depois do anúncio da privatização, surgiu no distrito um grande
alarido à volta do assunto sem que, a meu ver, razão alguma o
justifique. Inclusivé, várias autarquias, entre as quais Alcochete,
fizeram aprovar moções contra a privatização da EGF apenas por motivos
de natureza político-partidária e com o único propósito de levantar
turbulência e fomentar a contestação. Sem ter em conta o verdadeiro
alcance da medida e os benefícios sociais que dela decorrem para as
populações.
De qualquer modo, polémicas à parte, convém
compreender com clareza quais os fundamentos que suportam toda a
reestruturação do sector dos resíduos sólidos urbanos, assim como a
respectiva privatização da EGF. Feito isso, facilmente se constata a
bondade e o sentido daquela decisão. Deixo algumas pistas:
- A privatização da EGF faz parte do Memorando de Entendimento assinado com a “troika” e é uma exigência de Bruxelas;
-Ao Estado deve apenas caber o papel de supervisor em termos
económicos e ambientais, tendo ainda, enquanto concedente, a obrigação
de zelar pelo cumprimento dos níveis do serviço público que são
prestados;
- A privatização visa proporcionar um encaixe de
relevo e reduzir as responsabilidades do Estado sobre uma enorme dívida
financeira, estimada no valor de 200 milhões de euros, com tendência
para se avolumar, caso continue a perdurar o actual modelo de gestão e
esta estrutura accionista;
-Promover a sustentabilidade global
dos sistemas e, por força de uma maior eficácia na gestão, conseguir
atingir as metas previstas no Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos
(PERSU 2020);
-Atribuir à Entidade Reguladora dos Serviços de
Àguas e Resíduos (ERSAR) poderes de fiscalização e regulação na
arbitragem entre concessionários e municípios;
A
intenção do Governo mostra-se adequada. Tal como actualmente o panorama
se apresenta, onde o volume de endividamento assume contornos
preocupantes, a actividade operacional começa a denotar ineficiências
várias devido à escassez de recursos e a capacidadede investimento do
Estado e dos municípios é quase nula, torna-se natural qua a qualidade
dos serviços se comece a deteriorar. Nesta perspectiva, a privatização
vai certamente garantir a manutenção ou melhoria dessa qualidade,
renovar equipamentos e harmonizar as disparidades das tarifas que são
praticadas entre os diferentes sistemas.
E não será despiciendo
pensar que o novo concessionário tenciona dar dimensão e escala aos
sistemas e reforçar a capacidade financeira dos mesmos. A ser bem
sucedido neste negócio, poderá até alargar os seus investimentos a
outras áreas, no domínio do ambiente, da energia ou outros, induzindo
assim um efeito multiplicador ao conjunto da economia portuguesa. À
semelhança do que grandes operadores privados fizeram em outros sectores
nevrálgicos do tecido produtivo nacional. Com os consequentes
benefícios para a criação de emprego e para a arrecadação de taxas e
impostos.
A reestruturação do sector dos resíduos sólidos
urbanos vem no tempo certo. Por exigência da “troika” mas também por
exigência dos portugueses. Porque a manter-se o actual modelo de gestão e
interacção entre partes, à EGF e respectivos sistemas intermunicipais
não restará outro caminho senão a insolvência ou a declaração de
incapacidade para atingir os objectivos ambientais previstos no PERSU
2020.
De sublinhar que só à Amarsul a dívida global dos
municípios da península de Setúbal já ascende a mais de 20 milhões de
euros. Esta empresa, que realizou investimentos avultados, começa a
viver uma situação alarmante. Daí que, alterar o paradigma de
administração no sector, liquidar compromissos assumidos, modificar o
perfil da estrutura accionista das empresas e reforçar as competências
da ERSAR afigura-se de todo conveniente. E urgente.
Por fim, de
referir que o objecto da privatização é apenas a empresa EGF, uma
“sub-holding” que presta o serviço e faz a gestão das infraestruturas a
ele afecto. Não as próprias infraestruturas. Terminada a concessão,
estas revertem para a propriedade dos municípios ou associações de
municípios. São, pois, pertença do Estado. E quanto à nacionalidade dos
concorrentes não há preocupação alguma porquanto considera-se uma mais
valia trazer para Portugal as melhores práticas que lá fora se usam.
Tenha para mim que a privatização duma empresa essencial a este
importante sector configura um projecto estratégico adequado aos
desígnios de desenvolvimento da economia nacional. Creio que todos vamos
perceber como as “coisas” se irão passar, não havendo motivos para
sucumbir aos “tiques de colectivização” daqueles para quem a mudança e a
modernização são sempre “sinais de desgraça”.
Reestruturar o sector dos RSU é assim uma questão de futuro. Interessa a todos nós. Interessa a Alcochete.
in "Alcaxete", 27/2/2014