Existe dissimulada em Alcochete uma praça com nome de largo. Podemos apontar o Largo de São João como o único de dois grandes espaços publico em Alcochete do núcleo Histórico (ou outro, é o actual jardim do Rossio), ambos com a mesma origem, ambos bem assimilados pela população. Mas a importância que o Largo de São João tem no contexto urbano de Alcochete não está correctamente contextualizada.
A importância da praça no desenho urbano torna-se relevante no contraste que existe entre o espaço publico e o espaço privado. Ao privado associa-se as actividades da casa, do intimo e do trabalho e o domínio da acção está no domínio da esfera publica. O privado está na base da necessidade, enquanto o publico está na liberdade.
Mas qual a diferença entre um largo e uma praça? Na definição das duas palavras quase nada mas morfologicamente apresentam algumas diferenças. Ambas são o resultado do espaço vazio em contraponto ao espaço edificado. No entanto, um largo não tem a complexidade de relações que uma praça possui, sendo quase sempre o resultando do espaço que sobra da intercepção de duas ou mais ruas sem a necessidade de uma atenção especial ou uma regularização ao nível da forma. A diferença na definição de largo ou praça é que devido a sua importância, são o resultado de transformações posteriores ou o resultado de uma acção de de regularização dos espaços. Dai, normalmente, apresentem uma configuração diferente, quer ao nível da escala, quer ao nível do enquadramento urbano.
Morfologicamente, a praça é o resultado do vazio delimitado pelo privado, que cunha a memória colectiva e actividade pública das populações. É na praça que se troca os produtos, é na praça que se aplica o poder (a praça medieval possuía, por norma, o pelourinho para administrar o poder de uma forma populista como o objectivo de dar o exemplo as populações), onde se organizava as festas, onde se dá as palestras, onde se marcam os encontros. De resto, desde a antiguidade até aos nossos tempos muito pouco se alterou em relação a função social da praça publica. Embora em Alcochete o centro político de origem foi no actual Largo de Republica, muito facilmente transitou para o Largo de São João. A razão desta migração é simples. Segundo os textos, havia em Alcochete dois rossios. Segundo o tombo do concelho, de 1548, “A vila tinha dois rossios, um que partia das casas que foram do infante D. Fernando até as fontainhas, onde lavavam as mulheres, e outro da igreja de S. João ate a cabeça da vila”. Um rossio no período medieval era um espaço amplo que se encontrava normalmente nas entradas ou saídas dos centros urbanos. O objectivo era proporcionar um espaço livre considerável para a realização e eventos de massa - tal como mercados e feiras - ou até, o despejo de lixos ou outras actividades menos nobres, que necessitavam de ser realizadas fora dos aglomerados. Neste caso em particular, o rossio onde “lavavam as mulheres”, é o que nos tempos de hoje continuamos a chamar rossio, na Av. D. Manuel I. O outro era então o actual Largo de São João, com a Igreja á cabeça. O que acontecia neste rossio podemos verificar segundo s textos de Garcia de Resende e Gabriel Pereira:
"(...) Estando El-Rei em Alcochete, indo um dia de casa a pé com a Rainha, e damas e senho-res e muitos fidalgos a ver correr touros no terreiro junto da igreja, acertou que metendo um touro na cancelia fugio do corro e veio por a rua principal por onde El-Rei ia, e diante io touro vinha muita gente fugindo com grande gritaria.(...)”
A administração do poder local na zona e Alcochete e Aldeia Galega (Montijo), antes da atribuição do foral em 1515 por D. Manuel I, era feito na freguesia de Nossa Senhora da Sebonha, hoje a zona onde se localiza São Francisco, através do convento então existente. Devido ao elevado crescimento populacional nas duas localidades, o Rei atribuiu um foral desdobrando administração das ambas para dois novos concelhos em dois novos centros administrativos. No caso de Alcochete, a administração foi deslocada para a freguesia do mesmo nome com sede na Igreja de S. João Baptista, a Igreja matriz de Alcochete. Esta operação vai dar uma nova centralidade ao largo de São João. Obviamente, acaba por acontecer mais tarde, a deslocação dos paços do concelho para a mesma zona, no séc. XVIII, tendo então ocupado a antiga casa-solar da antiga família dos Pereiras.
No ponto de vista histórico, compreende-se então a importância deste antigo rossio em particular, onde os nobres vinham ver correr os touros, que passou a servir a sede religiosa do concelho, a sede do poder local com a deslocação dos paços do concelho e onde ficava outras referencias da memória da população, como o poço da vila - que antes da canalização das aguas servia a população da vila - ou até, de uma forma aparentemente indiferente mas que tem a sua importância, o primeiro candeeiro a gás, quando a iluminação no resto da vila se fazia a petróleo. Verificamos que ainda hoje, é no largo de São João que acontece os principais eventos na vila e onde se centra a actividade económica dentro do centro histórico. Ainda hoje, continua a ser a sede do poder político, a sede do poder religioso e a sede da memória colectiva daquilo que representa e representou Alcochete para a sua população.
Com este contexto, o largo de São João tem condições para que se altere morfologicamente para ser a praça de Alcochete. Atendendo ao desenho urbano, o Largo de S. João tem forma trapezoidal com cerca de 75 metros de comprimento e em largura, 35 metros no ponto mais largo e 25 metros no ponto mais estreito, ladeado por edificado com variação de pisos entre 1 a 3 pisos com construções que variam entre o séc. XIV e a actualidade, o que significa que carrega consigo potencialidade, quer no ponto de vista da sua configuração, localização e dimensão para se efectuar uma proposta concreta que alterem com o objectivo de preservar e manter o carácter e a função que sustentou ao logo dos tempos.
3 comentários:
Gostei!
Bom trabalho!
Parabéns!
Bom trabalho Bruno, independentemente de estar resumido, está muito, muito bom.
Parabèns!
Bruno está um excelente trabalho,de um jovem mas grande Arquitecto e que o vai provar futuramente!
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